Título: Uso do câmbio para conter a inflação volta à discussão
Autor: Assis, Francisco Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/04/2011, Economia, p. B8

Brasília

O susto dado pela alta da inflação em março, que surpreendeu até o governo, e a ineficácia das últimas medidas cambiais, trouxeram de volta o debate sobre o uso da taxa de câmbio para o combate à inflação.

No governo e no mercado financeiro há mais vozes defendendo que se deixe o real valorizar mais livremente para que se possa obter um recuo mais rápido da inflação. E já há até suspeitas de que a política econômica esteja caminhando nessa direção, apesar dos discursos em contrário. Ontem, o dólar fechou com nova queda, a R$ 1,574, acumulando recuo de 5,4% no ano - a maior parte só neste mês.

As estimativas de impacto da queda do dólar nos índices de preços variam, embora de maneira geral se reconheça que, seja de magnitude elevada ou reduzida, um movimento de valorização do real ainda contribui para reduzir a inflação. Alguns economistas de mercado estimam que, para uma valorização de 10% do real (por exemplo, de R$ 1,65, piso que vinha sendo defendido até cerca de duas semanas pelo governo, para R$ 1,50) reduziria o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) anual perto de 0,5 ponto porcentual.

Outros, como o professor da USP Fabio Kanczuc, enxergam repasse maior, em torno de 15%: ou seja, redução de 1,5 ponto porcentual na inflação anual para cada 10% de valorização do real. Há outros que estimam o impacto entre essas duas visões, como indica um estudo que circula no Ministério da Fazenda e que coloca o repasse na casa dos 7%.

"O impacto do câmbio na inflação é muito grande. O efeito maior é sobre os preços comercializáveis (aqueles que podem ser substituídos por importados)", avalia Kanczuc. Para ele, os benefícios para a população de deixar a taxa flutuar compensam os prejuízos para a indústria.

Direção correta. O economista da Tendências Consultoria Silvio Campos Neto entende que o impacto do câmbio na inflação hoje é relativamente pequeno, mas considera que deixar a moeda flutuar é um passo na direção correta. Ele explica que a valorização da moeda ajuda a atenuar o impacto da alta das commodities na inflação interna. Nos demais produtos, o efeito depende de outras variáveis, como a trajetória dos preços internacionais. "Em momentos como esse, de inflação em alta, a ajuda é bem vinda", afirmou.

No governo, a preocupação com a trajetória da moeda permanece. Além do impacto negativo para o setor exportador, a visão é de que deixar o câmbio apreciar demais acaba estimulando uma tomada excessiva de dívida em dólar, que depois, quando se reverter, pode gerar problemas para as empresas e para a economia. Dessa forma, o governo defende atenuar o movimento de alta do real.