Título: A venda foi um péssimo negócio
Autor: Henrique, Brás
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2011, Economia, p. B6

Ex-presidente da Usina Santa Lydia, em Ribeirão Preto, conta como a família precisou se desfazer [br]da usina que começou a produzir etanol em 1932, durante a 2ª Guerra Mundial

"Nunca deveria ter vendido, foi um péssimo negócio, um desastre." Assim resume a venda da Usina Santa Lydia o seu ex-presidente (entre final dos anos 60 e década de 80), Luiz Antonio Ribeiro Pinto, de 79 anos. A transação, fechada em 1995, ainda traz dores de cabeça à família, pois a maior parte do valor não foi pago e existe litígio judicial até hoje.

A empresa era de médio porte e chegou a moer 1,5 milhão de toneladas de cana por ano, empregando cerca de 3 mil funcionários. Após alguns anos, a propriedade foi arrendada e em seguida leiloada. A área agora é do Produtor Independente de Energia de Ribeirão Preto (Pierp), que produz eletricidade do bagaço da cana. Da antiga moenda sobraram ruínas, e as estruturas da destilaria e da refinaria serão vendidas.

Histórico. A Usina Santa Lydia surgiu em 1946, fundada por Arnaldo Ribeiro Pinto, pai de Luiz Antonio. Mas na fazenda, do mesmo nome, com algodão e café, adquirida pelo avô Luiz Augusto Pinto, no final dos anos 20, começou-se a produzir álcool ainda em 1939, para mistura do produto à gasolina durante a 2ª Guerra Mundial. "Meu pai começou com uma usina pequena, para 200 mil toneladas de cana por ano, o que hoje seria uma brincadeira", comenta Luiz Antonio, referindo-se ao atual momento, com as grandes empresas nacionais e grupos estrangeiros abocanhando as pequenas unidades. O criador da usina investiu pouco em terras e ficou cercado por canaviais de concorrentes na região.

A Santa Lydia era estável, mas, ao ter o contrato de um fornecedor de cana rompido dois anos antes do vencimento, a empresa se endividou em 1994 com compras de terras, cana e equipamentos, pedindo concordata. A venda foi para um empresário local, que não pagou a maior parte do acordo e repassou a usina ao grupo ligado ao antigo fornecedor de cana, a Nova União. Daí a frustração do negócio.

"A venda era uma boa saída, foi a conclusão da época", lembra Arnaldo Adams Ribeiro Pinto, filho de Luiz Antonio, que atuou na área comercial da usina, entre 1985 e 1988, responsável por vendas a varejo de açúcar cristal. A planta industrial foi praticamente desativada e, com dívidas trabalhistas, foi a leilão.

Luiz Antonio, que é engenheiro mecânico, lembra que gostava mesmo é de tecnologia e que seu pai já pensava em mecanização da cana na década de 50. Por isso, criou a Santal, fabricante de implementos para o setor sucroalcooleiro, em 1960. Ele faz os projetos e preside o conselho administrativo.

Adams, que dirige a Santal, lembra que a usina tinha tecnologia de ponta em produção e era a única exportadora brasileira de álcool fino (para indústria farmacêutica, química e de bebidas). E acrescenta: "A área da usina está muito próxima da cidade e, hoje, se funcionasse, teria problemas ambientais com a Justiça".

Hilário Cavalheiro trabalhou 13 anos como gerente da Usina Santa Lydia, esteve fora no momento ruim, e há 10 anos dirige a Pierp. Ele conhece bem a história da antiga usina, que foi adquirida em leilão por R$ 37 milhões, em 2007. Antes, em 2001, após o apagão no Brasil, a Pierp (criada pelos grupos J. Malucelli, Orteng, D"Watt e Logos) arrendou a área, com equipamentos, para produzir energia até 2004. A geração começou em 2002, com compras de bagaço de várias usinas.

Com a atividade retomada em 2007, a J. Malucelli comprou a parte das outras três sócias no ano seguinte, mantendo 90 funcionários, que agora fazem a manutenção dos maquinários. A produção ocorre em períodos de seca, sendo a última entre maio e dezembro de 2010.

A Pierp tem capacidade para produzir 30 megawatt hora (MW/h) e fatura R$ 40 milhões por ano. A empresa mantém reserva de segurança de 60 mil toneladas de bagaço, para um mês de serviço.

Enquanto isso, Cavalheiro comanda outras operações dentro da área da primeira e antiga usina ribeirão-pretana. Ele chama de "coliseu" as ruínas de estruturas da moenda e da destilaria. A refinaria está em processo de desmontagem e irá para uma usina do Paraná mediante pagamento de R$ 5 milhões.

Há dois anos, a área que abrange os 13 reservatórios de álcool (com capacidade para armazenar 61 mil litros) foi vendida à Delta Tanques por R$ 4 milhões. As 20 casas da antiga colônia de trabalhadores estão sendo demolidas. Dos 150 alqueires da área, 100 deles estão destinados ao plantio de cana, com venda para usinas da região. Esse é o atual quadro do que foi, um dia, a Usina Santa Lydia.