Título: Oposição síria esbarra na falta de líderes
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2011, Internacional, p. A9

Para analistas, regime de Assad se beneficia da imagem de promotor da estabilidade

Apesar de a liderança do movimento de oposição ao governo sírio não ter ainda um perfil claro, analistas estimam que ela aprendeu a lição da Tunísia e do Egito - que depuseram regimes autoritários respectivamente em janeiro e fevereiro. O grupo tem conseguido utilizar as redes sociais da internet para convocar e organizar manifestações maciças e disseminar informações para o exterior.

Desde a intensificação dos protestos, há seis semanas, o regime de Bashar Assad proibiu a entrada de jornalistas estrangeiros no país e restringiu as informações sobre os eventos políticos aos comunicados oficiais.

O principal problema da oposição para ir além das mobilizações, ressaltam especialistas, é a falta de líderes capazes de ocupar o palácio do governo em Damasco, caso o regime do Partido Baath efetivamente caia. Para o jornalista americano Nicholas Blanford, especialista em questões do Oriente Médio, "até agora, não apareceu nenhum candidato com chances reais de suceder a Assad ou com as necessárias credenciais intersectárias, étnicas e políticas para assegurar a estabilidade do país.

"Os sírios mais velhos lembram-se bem da longa sequência de golpes e contragolpes dos anos 40 e 50, antes de o Baath tomar o poder, em 1963", diz Blanford. "É de se supor que hoje poucos sírios estariam dispostos a assistir ao retorno dessa situação, particularmente tendo testemunhado sangrentas guerras civis na vizinhança, como no Líbano e no Iraque."

Até o começo desta semana, a aposta mais comum entre as agências de risco era a da permanência do regime - equilibrando-se entre a repressão física do movimento de oposição e a concessão a algumas demandas populares, como o levantamento do estado de emergência iniciado há quase cinco décadas. Apesar de considerarem mais provável a permanência de Assad no poder, o grau de violência dos últimos episódios da repressão pode tornar sua posição insustentável.

"Os últimos protestos na Síria aumentam o risco para o regime e complicam a sua estratégia de usar a força contra os opositores e realizar reformas que agradem ao restante da população. Há sinais de que as forças opositoras começaram a se armar, apesar de a maior parte dos protestos serem pacíficos", segundo o analista Ayham Kamel, da Eurasia.

Na avaliação dele, o cenário mais provável (45%) ainda é o de Assad conter os protestos. A chance de ele se manter no poder, mas enfraquecido, é de 35%. E a mudança de regime, por enquanto, tem uma probabilidade de 20%. Há uma semana, as consultorias de risco político praticamente descartavam essa hipótese.

O regime sírio tem diferenças internas, a começar pela forma de reprimir os protestos. O Exército não estaria interessado em usar a violência em larga escala. Mas membros do Partido Baath pressionam Assad a ser duro como foi o pai, Hafez, em Hama, nos anos 1980. Na época, Hafez Assad massacrou milhares de civis para reprimir levante de radicais islâmicos ligados à Irmandade Muçulmana.

"Assad tem ainda mais apoio popular do que outros líderes do Oriente Médio derrubados nos levantes recentes. Mas ele está gastando seu capital político ao combater os protestos com violência", diz Mohammad Bazzi, do centro de estudos americano Council on Foreign Relations. / AP E CSM. COLABOROU GUSTAVO CHACRA

EUA sobem tom de críticas O presidente americano, Barack Obama, condenou ontem o uso da violência contra manifestantes na Síria e acusou o regime de buscar ajuda do Irã para reprimir os protestos. O presidente divulgou um comunicado em tom mais duro que o habitual sobre a crise síria.