Título: Síria conta 88 mortes em dia mais violento desde o início das revoltas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/04/2011, Internacional, p. A9

Forças de segurança disparam indiscriminadamente contra multidão de manifestantes que pediam a renúncia de Bashar Assad em várias cidades do país; regime revogou estado de emergência na quinta-feira, mas medida foi considerada insuficiente por opositores

DAMASCO

Pelo menos 88 pessoas morreram ontem em conflitos entre dissidentes e forças de segurança da Síria. A agência de notícias Reuters divulgou uma lista com os nomes e os locais das mortes, que ocorreram em várias cidades do país. A maioria das vítimas foi executada indiscriminadamente por soldados, que atiraram contra a multidão.

Na quinta-feira, o presidente Bashar Assad suspendeu o estado de emergência que vigorava desde 1963. A medida, no entanto, parece não ter dado resultado. Aproveitando as preces de sexta-feira, líderes dissidentes haviam prometido realizar as maiores manifestações até então contra o presidente Assad. Batizado de "A Grande Sexta-feira", o dia acabou sendo o mais violento desde que começaram os protestos na Síria, no dia 15 de março.

Testemunhas disseram que pelo menos 20 pessoas morreram na localidade de Izra, na Província de Deraa, ao sul da capital Damasco, perto da fronteira com a Jordânia, epicentro das manifestações contra o regime de Assad.

Oito pessoas morreram em Douma, 15 quilômetros ao norte de Damasco. Mortes também foram registradas em Barzeh, Harasta e Maadamiya, na periferia da capital, em Hama, 210 quilômetros ao norte de Damasco, em Latakia, principal porto do país, e na cidade de Homs, na região central da Síria. Houve protestos também contra Assad no Líbano e no Chipre.

Um vídeo postado no YouTube mostrou uma multidão chutando a cabeça de uma estátua de Hafez Assad, pai do atual presidente, que governou o país de 1971 a 2000. O vídeo foi teria sido gravado ontem na localidade de Darayya, subúrbio de Damasco.

Várias dezenas de pessoas ficaram feridas por disparos das forças de segurança. De acordo com o diretor da Organização Nacional para os Direitos Humanos da Síria, Amar Qurabi, pelo menos 20 manifestantes estão desaparecidos.

"Não houve provocação", disse Wissam Tarif, diretor da Insan, ONG que defende a democracia na Síria, em referência aos protestos em Homs. "Eles (forças de segurança) atiraram indiscriminadamente."

Críticas. Treze grupos de defesa dos direitos humanos que atuam na região assinaram ontem um documento criticando a Liga Árabe por apoiar a candidatura da Síria a uma vaga no Conselho de Direitos Humanos da ONU - a votação é em maio.

"O apoio da Liga Árabe demonstra um flagrante desrespeito pelos sentimentos e pelos direitos do povo sírio, que superou a barreira do medo e se insurgiu em uma revolta", diz o documento assinado por ONGs do Egito, Bahrein, Argélia, Arábia Saudita, Iraque, Iêmen e Sudão.

O grupo acusa a Liga Árabe de incoerência e de manter um "discurso duplo". Segundo as ONGs, a organização condena a violência contra dissidentes na Líbia, mas acaba "premiando o regime sírio por sua repressão à população".

Em Genebra, Assad também recebeu duras críticas da ONU, que condenou a violência e alertou que Damasco precisa "aprender" com os acontecimentos na Líbia para evitar que a situação se transforme em "conflito armado".

A alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, apelou para que haja uma investigação "independente" sobre as mortes dos últimos dias e pediu a "libertação imediata" de dissidentes presos. / REUTERS e AP. COLABOROU JAMIL CHADE