Título: Morte pode marcar virada histórica
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2011, Internacional, p. A12

Estaríamos vivendo um momento crucial da história? Quando soube da notícia a respeito de Osama bin Laden e vi a catártica manifestação de orgulho nos Estados Unidos, meus pensamentos voltaram não apenas para o 11 de setembro de 2001, mas também para algumas outras datas que marcaram o curso dos acontecimentos globais, cheios de promessa ou perigo.

Serão necessários anos para que conheçamos as consequências do assassinato de Bin Laden para a política externa americana; elas podem ser apenas transitórias. Mas o momento atual transmite a impressão de ser um ponto de virada - ao menos para a identidade americana, se não para todo o mundo.

O arco da história deve sempre incluir a 2.ª Guerra. No dia 30 de abril de 1945, Adolf Hitler cometeu suicídio em seu bunker em Berlim. Naquele momento, Hitler já tinha perdido a guerra. Há outro acontecimento, ocorrido dois anos antes, que hoje nos parece mais relevante. Em 1943, os EUA estavam envolvidos em pesados combates no Pacífico. Os 16 meses transcorridos desde o ataque a Pearl Harbor não tinham sido tão positivos quanto os americanos esperavam. As forças dos EUA triunfaram nas batalhas de Midway e Guadalcanal, mas as baixas foram altas. As forças japonesas continuavam relativamente intactas, e os líderes em Tóquio ainda acreditavam na vitória.

O grande planejador do ataque a Pearl Harbor foi Isokoru Yamamoto, comandante da frota japonesa que tinha estudado em Harvard. Em 18 de abril de 1943, um esquadrão interceptou e derrubou o avião que transportava Yamamoto. O impacto da morte dele sobre o moral tanto dos americanos quanto dos japoneses foi imediato. Depois daquele momento, a vitória americana na guerra do Pacífico seria apenas questão de tempo.

Não podemos saber ao certo como o assassinato de Bin Laden vai alterar a guerra contra a Al-Qaeda; uma guerra desse tipo não chega ao fim com uma rendição e uma cerimônia para a assinatura de acordos. Mas os americanos acabam de vencer uma batalha decisiva.

Uma operação militar fracassada teve o efeito oposto àquele provocado pela morte de Yamamoto. No fim de 1979, militantes iranianos invadiram a Embaixada dos EUA em Teerã e tomaram 52 americanos como reféns. O presidente Jimmy Carter autorizou uma missão com o objetivo de libertar os reféns. Mas uma tempestade de areia prejudicou a movimentação de dois helicópteros e, depois que a missão foi abortada, um terceiro helicóptero colidiu com um avião de transporte matando oito soldados americanos. Depois de 444 dias de cativeiro, os reféns foram libertados, mas a fracassada tentativa de resgate se tornou um símbolo da inépcia e da inaptidão dos americanos.

George W. Bush galvanizou o país após o 11/9, mas suas guerras no Afeganistão e no Iraque seguiram um ritmo arrastado, prejudicadas pelos equívocos de espionagem, pelas contraproducentes bravatas e pela consciência de que não tínhamos trazido à justiça o responsável pelo 11/9.

Para alterar esta percepção de falta de controle sobre os acontecimentos seria necessária uma grande vitória, como o assassinato de Bin Laden. No domingo, foi anunciado o sucesso da missão contra o líder da Al-Qaeda. Ainda é cedo para saber se Obama será um grande presidente, mas podemos agora ter a certeza de que ele não é um Jimmy Carter.

A operação para assassinar Bin Laden foi conduzida com impressionante competência, culminando na sábia decisão de purificar o corpo dele antes do enterro no mar. Os políticos de direita terão agora mais dificuldade em acusar Obama de agir com fraqueza e brandura no combate ao terrorismo; talvez alguns eleitores se convençam até de que ele não é muçulmano, afinal. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL