Título: Chineses disputam topo do ranking de gastos no exterior
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/05/2011, Economia, p. B15

Reportagem especial

Gigante em turismo

Neste ano, turistas chineses devem deixar US$ 55 bilhões no exterior, assumindo a terceira posição entre os que mais gastam fora do país. Mas projeções indicam que em 2015 eles estarão em primeiro lugar

Cláudia Trevisan - O Estado de S.Paulo

Segunda maior economia do mundo e dona do primeiro lugar no ranking dos exportadores, a China caminha para se tornar a principal fonte de lucros da indústria do turismo global em poucos anos, com aumento no número de viajantes e de suas compras.

Estereótipo do poupador dentro de casa, os chineses são generosos no exterior e registram um dos maiores gastos per capita do mundo, grande parte dos quais em produtos de luxo de marcas como Louis Vuitton, Gucci, Burberry e Ermenegildo Zegna.

Neste ano, eles vão ultrapassar os britânicos e assumir a terceira posição entre os turistas que mais deixam dinheiro fora de suas fronteiras, atrás apenas de Alemanha e Estados Unidos.

As autoridades chinesas estimam que a cifra chegará a US$ 55 bilhões, o equivalente a 1,8 vez as exportações do Brasil ao país asiático em 2010, de US$ 30,8 bilhões. Estudo do banco UBS prevê que o valor poderá alcançar US$ 190 bilhões em 2015, o que colocaria os chineses no topo do ranking dos turistas mais gastadores. Os alemães, atuais ocupantes da posição, deixaram quase US$ 80 bilhões em outros países em 2010.

Como tudo o que envolve a China, a transformação no turismo é vertiginosa e de proporções gigantescas. Fechado ao mundo até o fim dos anos 70, o país começou a entrar no radar dessa indústria só na década de 90, quando as restrições para viagens privadas ao exterior começaram a ser reduzidas.

O número de turistas chineses superou a marca de 10 milhões em 2000, atingiu 31 milhões em 2005 e chegou a 57,4 milhões no ano passado - cifra dez vezes superior aos 5,2 milhões de visitantes estrangeiros que o Brasil recebeu em 2010. Em 2009, seus gastos superaram pela primeira vez o de turistas que visitaram a China naquele ano - foram US$ 42 bilhões, ante US$ 39,7 bilhões.

Nenhum grupo de turistas vincula tanto viagens à compra de produtos de luxo como os chineses. Analistas estimam que metade dos gastos nesse segmento é feita fora do país, onde há isenções ou restituição de impostos aos estrangeiros. As antigas filas de japoneses em frente à loja da Louis Vuitton na Champs Elysées, em Paris, são agora formadas por chineses.

Em 2009, os habitantes do antigo Império do Meio desbancaram os russos e atingiram ao topo do ranking de visitantes não europeus que mais gastam na França. Em todo o mundo, hotéis, lojas, restaurantes e empresas aéreas desenvolvem estratégias para atrair esse grupo, que não gasta tanto em hospedagem e alimentação, mas é perdulário nas compras.

Brasil. A brasileira TAM acaba de abrir um escritório em Pequim para captar os passageiros que vão para o Brasil via Europa. "Nossa previsão é que a demanda da China será muito grande", disse Carlos Ribeiro, gerente-geral da companhia aérea no país asiático. Segundo ele, não há planos de criação de um voo da China para o Brasil por enquanto, e a empresa pretende trabalhar com Air China e Lufthansa no trecho até a Europa, onde a TAM receberia os passageiros.

Atualmente, a Air China é a única companhia com voos diretos entre os dois países, com escala em Madri, três vezes por semana. A maioria dos chineses que visita o Brasil vai a trabalho, e não a passeio. Por causa da expansão econômica, do aumento do comércio e do volume cada vez maior de investimentos chineses no exterior, as viagens de negócios no país também vivem uma explosão.

De acordo com o Conselho Mundial de Viagens e Turismo, os gastos das empresas chinesas com o envio de seus funcionários para visitas a outros países passaram de US$ 18 bilhões em 2000 para US$ 62 bilhões no ano passado. A entidade prevê que a cifra chegará a US$ 277 bilhões em 2020, o que transformará a China no segundo maior mercado de viagens de negócios do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

"A maioria dos chineses vai ao Brasil participar de feiras ou fazer negócios e acaba ficando alguns dias a mais. É esse turismo de negócios que nós tentamos explorar", diz o diplomata Gláucio Veloso, responsável pelo setor econômico-comercial do Consulado do Brasil em Xangai. No ano passado, os consulados em Xangai e Pequim concederam 22,4 mil vistos a chineses, dos quais cerca de 18 mil foram de negócios. Os vistos de turismo representaram pouco mais de 3 mil do total e o restante foi de autorizações de trabalho, serviços de assistência técnica ou visitas oficiais.

O chefe do setor consular em Pequim, Benhur Viana, avalia que o número de vistos concedidos só na capital poderá passar dos 15,9 mil de 2010 para 20 mil neste ano, sob o impacto da visita da presidente Dilma Rousseff ao país em abril. Nos quatro primeiros meses do ano, 6.284 chineses pediram autorização para ir ao Brasil, aumento de quase 40% em relação ao ano passado.

Nas viagens a passeio, o principal motor da expansão do turismo chinês é o aumento da renda, impulsionado pelo crescimento médio anual de 10% do PIB nas últimas três décadas. Na avaliação dos economistas do UBS, o divisor de águas foi 2002, quando 16,6 milhões de turistas chineses ultrapassaram as fronteiras do país. No ano anterior, a renda per capita havia superado a marca de US$ 1 mil. Dez anos mais tarde, a renda per capita já estava em US$ 4 mil.

O movimento de descoberta do mundo pelos chineses está só no começo e continuará nos próximos anos. A Organização Mundial do Turismo estima que o número de chineses a passeio chegará a 100 milhões em 2020, previsão que parece conservadora diante dos 65 milhões esperados para este ano.