Título: ANS nomeou acusado de estelionato como interventor em cooperativa
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/2011, Vida, p. A20

Diretoria da agência federal indicou Marcelo Lima dos Anjos para acompanhar operação de resgate financeiro de associação de dentistas do DF em 2009, um ano depois de ele ter sido preso, e ainda renovou mandato até julho; no total, ele recebeu R$ 62,7 mil

Criticada pelo alto custo e pela ineficiência das ações de socorro feitas em operadoras de saúde com problemas financeiros, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) escolheu uma pessoa acusada de estelionato e de falsificação de documentos para atuar como interventor em uma cooperativa de dentistas.

Marcelo Lima dos Anjos foi nomeado em junho de 2009 para acompanhar a operação de resgate financeiro da Odontus Cooperativa dos Odontólogos, no Distrito Federal. O fato de Anjos ter sido preso um ano antes sob acusação de estelionato não impediu a sua indicação, aprovada em reunião por todos os diretores da agência.

Procurada, a ANS informou que os documentos de Anjos não indicavam condenações. Em 2009, durante o período em que atuou no posto como diretor fiscal, Anjos teve R$ 62,7 mil depositados em sua conta pela agência.

Além de desconhecer as acusações, a ANS não acompanhou de perto seu "interventor". Na sexta-feira passada, procurada pelo Estado, a agência afirmou que o mandato de Anjos fora renovado até julho de 2011.

Nova versão. Confrontada com a informação de que Anjos não aparecia na cooperativa desde meados do ano passado, a ANS mudou de versão. Disse que havia se enganado e outra pessoa estava exercendo o posto de diretor fiscal da cooperativa. Não informou, porém, o nome do novo funcionário.

Na edição de segunda-feira, reportagem do Estado mostrou que entre 2005 e 2009 a ANS repassou para operadoras com problemas financeiros e em liquidação extrajudicial R$ 33,6 milhões, mas apenas 8% das empresas socorridas no período se recuperaram.

Os empréstimos, previstos em lei, têm de ser feitos para pagamento de diretores fiscais, pessoas nomeadas pela agência para acompanhar o processo de saneamento das contas das empresas ou, em casos mais graves, liquidantes, para acompanhar a liquidação. Recursos são destinados também para pagar as despesas, como aluguel de imóveis para guardar pertences da empresa liquidada. Terminado o processo de direção fiscal ou liquidação, o dinheiro tem de ser devolvido pela empresa à ANS. No período analisado pela reportagem, menos de 1% foi ressarcido.

Em tese, diretores fiscais e liquidantes são escolhidos em um banco de currículos. Pelas regras, a indicação somente pode ser aprovada depois da análise de certidões negativas criminais, além de certidões negativas de débitos e tributos. Depois da análise, o nome indicado tem de passar pelo crivo da diretoria colegiada da agência.

Golpe. O currículo de Anjos que a ANS apresentou é semelhante ao que está no processo de estelionato que corre contra ele na 4.ª Vara Criminal de Brasília. Entre as qualificações, está a de que ele foi professor da Universidade de Brasília. Ele foi preso justamente na época em que chefiava uma comissão na Fundação de Estudos e Pesquisas em Administração e Desenvolvimento (Fepad), ligada à universidade, sob a acusação de não ter diploma e de preparar um golpe contra a fundação.

Atualmente trabalhando numa empresa em Formosa (GO), Anjos confirmou ao Estado sua atuação na ANS. "Eu respondo ao processo de estelionato, mas não fui condenado. Essa é uma acusação. Tive outras na Bahia, que foram arquivadas. Isso não me impede de trabalhar." Ele disse ter cursado a graduação no Centro Universitário da Bahia, embora a instituição tenha negado esse fato em ofício enviado à Justiça.

Uma funcionária da cooperativa que não quis se identificar confirmou que Anjos visitou por várias vezes o escritório da empresa em nome da ANS. "Nunca imaginei que seria um estelionatário. Primeiro, porque era indicado pela ANS. Depois, porque era muito simpático, inteligente e falante."

Defesa

MARCELO DOS ANJOS NOMEADO INTERVENTOR DA ANS

"A cooperativa estava uma bagunça e fiz um bom trabalho. Saí porque queria tocar meu negócio próprio."