Título: Ano será difícil para ações brasileiras
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/05/2011, Economia, p. B4

Mudança na cotação das commodities piora ainda mais o cenário e instituições financeiras refazem para baixo as projeções do Ibovespa

A ameaça de uma forte correção de preços no mercado internacional de commodities deixa o cenário para as ações brasileiras ainda mais incerto e já leva grandes instituições financeiras a revisarem para baixo a projeção para o Índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Ibovespa) no fim de 2011. No acumulado do ano até sexta-feira, o principal termômetro da bolsa nacional era o último colocado em um ranking com outros dez mercados.

O levantamento, que considera os índices em dólar para ser possível a comparação, mostrava o Ibovespa com desvalorização pouco superior a 5%. E, segundo especialistas, as perspectivas são de que essa realidade pouco - ou nada - mude nos próximos meses.

Se serve de consolo, eles dizem que este é um momento indicado para o pequeno investidor comprar papéis de boas empresas, de olho, claro, no médio e longo prazos (ver mais detalhes abaixo).

"Os dois trimestres que estão por vir não serão fáceis para as ações brasileiras", afirma o chefe de análise da Itaú Corretora, Carlos Constantini. "Temos visto muitas notícias boas, mas também muitas notícias ruins."

"O resultado disso é que o investidor não fica nem de bom nem de mau humor. Fica sem humor", define o principal executivo da Corretora Santander, Eduardo Jurcevic.

As palavras do executivo do Santander ajudam a sintetizar a situação na bolsa brasileira. Antes mesmo das quedas generalizadas nos preços das commodities, na semana passada, já havia muitas incertezas rondando a bolsa nacional, a maioria delas relacionada ao próprio Brasil.

"A questão macroeconômica tem sido determinante aqui, por causa da alta da inflação e consequente elevação da taxa básica de juros", explica o analista-chefe da Bradesco Corretora, Carlos Firetti. Dinheiro mais caro (ou seja, juro maior) reduz os resultados das empresas e, por tabela, o valor de suas ações em bolsa. "A história brasileira ficará interessante de novo quando a inflação voltar ao controle e vermos o final do ciclo de alta do juro", diz Firetti.

Peso político. Além disso, há outro fator que pouca gente no mercado financeiro fala diante dos microfones: a ingerência política do governo tem afetado o desempenho das duas principais empresas da Bovespa - Petrobrás e Vale. Como as duas juntas respondem por quase 26% do Ibovespa, puxam para baixo o indicador quando seus papéis se desvalorizam.

Nas contas do analista Walter Vitto, da Tendências Consultoria Integrada, a política do governo para os preços dos combustíveis já fez a Petrobrás deixar de ganhar R$ 4,1 bilhões de dezembro até maio. "Essa política é mais estável do ponto de vista dos preços, mas, em compensação, é ruim para a empresa e seus acionistas", afirma.

No caso da Vale, a fritura pública do presidente da empresa, Roger Agnelli, deixou os investidores inseguros. A pressão do governo culminou com a substituição do executivo por Murilo Ferreira, que oficialmente toma posse no dia 22.

A expressiva queda dos preços das commodities, ao longo da semana passada, adicionou ainda mais incertezas ao cenário. Dúvidas crescentes sobre a recuperação das economias desenvolvidas derrubaram os preços de produtos como petróleo, ouro, prata, soja, milho e alumínio.

O CRB, um indicador que sintetiza os preços nesse mercado, caiu quase 9% entre segunda e sexta-feira. O petróleo desabou 14,7% no mercado nova-iorquino. Como o Índice Bovespa tem grande concentração em empresas produtoras de commodities - além de Vale e Petrobrás, há outras, como Gerdau e CSN -, costuma acompanhar o movimento de queda. Na semana, desvalorizou 2,59%.

Por tudo isso, os analistas já começam a rever as estimativas para o Índice Bovespa no fim do ano. Por enquanto, a Bradesco Corretora mantém a expectativa de 86 mil pontos em dezembro - o que representa uma alta de 34% em relação ao fechamento de sexta-feira. A Itaú Corretora trabalha com um número próximo, 87 mil pontos e o Santander fala em 80 mil pontos.

Mas os executivos admitem que, mantido o cenário atual, será difícil atingir esses níveis. "Por enquanto, nossos modelos matemáticos continuam apontando 80 mil pontos. Mas o desempenho dependerá de muitas variáveis", reconhece Jurcevic. Entre elas - e principalmente -, a evolução da inflação (e da taxa de juros) no Brasil e a recuperação das economias desenvolvidas.