Título: Sucessão de Kahn opõe Europa a emergentes
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/05/2011, Economia, p. B9

Na França, nome da ministra da Economia, Christine Lagarde, já é cogitado como ideal

O Fundo Monetário Internacional (FMI) pode decidir nos próximos dias afastar Dominique Strauss-Kahn da direção da instituição, depois de sua prisão em Nova York - sob a acusação de tentativa de estupro. A hipótese foi aventada em Paris e Washington, e leva em consideração o papel central que o Fundo desempenha na crise das dívidas na União Europeia (UE).

A hipótese de demissão de Strauss-Kahn vem sendo evocada desde o fim de semana em razão do código de conduta do FMI. No contrato imposto pelo Fundo, seus funcionários devem obedecer "standards éticos muito elevados". No documento - que especifica até a indenização, em caso de demissão, de 60% do salário anual -, fica claro que "as obrigações de conduta" dos funcionários podem ser observadas durante o trabalho ou fora dele. O regulamento gira em torno de uma questão: se a imagem do FMI é afetada ou não.

O problema de Strauss-Kahn é que seu comportamento não é propriamente um exemplo na instituição. Em 2008, o francês já havia sido implicado em um escândalo sexual, envolvendo a economista búlgara Piroska Nagy, do qual saiu inocentado. Desde o início da nova crise, o FMI reagiu apenas com nota pública afirmando que "não fará comentários sobre o caso" e na qual garante estar "plenamente operacional". Mas não faz nenhum pronunciamento sobre se a imunidade do diretor-gerente será mantida ou retirada, medida que o garantiria no posto - ou abriria espaço à demissão.

Problema antecipado. Na prática, a crise na cúpula do FMI antecipa um problema que se prenunciava: a escolha de um substituto para Strauss-Kahn. Isso porque o atual diretor-gerente deveria deixar o cargo até 13 de julho, às vésperas das eleições prévias do Partido Socialista da França - ele era, até domingo, líder das pesquisas para o pleito de 2012, quase 10% à frente do atual presidente, Nicolas Sarkozy.

Ontem, Strauss-Kahn já foi substituído interinamente em Washington por seu adjunto, o americano John Lipsky, de 64 anos, a quem o francês definiu como "um amigo sincero" na última semana. Lipsky, porém, não será o diretor-gerente definitivo caso o francês renuncie ou seja demitido, porque na quinta-feira comunicou que se desligará da instituição em 31 de agosto, mantendo-se como "conselheiro especial" até novembro. E, em tom de despedida, o americano, ex-economista-chefe dos bancos JP Morgan, Chase Manhattan e Salomon Brothers, elogiou Strauss-Kahn.

Na hipótese de ficar sem Strauss-Kahn e sem Lipsky, a alternativa mais provável será convocar novo processo de seleção. E os europeus, que desde 1946 comandam o Fundo, já se movimentam para ficar no poder.

O nome do ex-primeiro-ministro do Reino Unido, o trabalhista Gordon Brown, foi cogitado, mas descartado por não contar com o apoio do atual premier, o conservador David Cameron. Angela Merkel, chanceler da Alemanha, demonstrou que se empenhará pela manutenção de um europeu no posto. "Nós sabemos que, em médio prazo, os países emergentes podem almejar os postos de direção do FMI e do Banco Mundial", ponderou ontem. "Mas, nesta fase, há boas razões para dizer que a Europa tem bons candidatos."

Ontem, a indicação da atual ministra da Economia da França, Christine Lagarde, ganhou força. Para o economista e acadêmico Nouriel Roubini, "a realpolitik dos Estados Unidos e da Europa poderia resultar na escolha da inteligente Lagarde."

CANDIDATOS AO FMI

Kemal Dervis Vice-presidente e diretor do programa de Economia Global e Desenvolvimento do Brookings Institution (Turquia).

Christine Lagarde Ministra de Finanças da França. Parece ser a principal candidata ao cargo.

Trevor Manuel Atuou como ministro de Finanças da África do Sul entre 1996 e 2009.

Agustin Carstens Tornou-se presidente do Banco do México em janeiro do ano passado.

Montek Singh Ahluwlia Influente conselheiro econômico do primeiro-ministro indiano.

Stanley Fischer Atua como presidente do banco central de Israel desde 2005.

Mohamed El-Erian Presidente-executivo da Pimco, maior investidor mundial em bônus. Trabalhou no FMI por 15 anos.

Peer Steinbrueck Apesar de vir do partido rival, desenvolveu uma relação próxima com a chanceler Angela Merkel em seu primeiro mandato.

Axel Weber Ex-chefe do banco central da Alemanha

Gordon Brown Ex-primeiro-ministro e ex-ministro de Finanças do Reino Unido