Título: Três líderes expõem a imagem da base
Autor: Lopes, Eugênia ; Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2011, Nacional, p. A8

BRASÍLIA - O palco da negociação e votação do Código Florestal armado no plenário da Câmara expôs na semana passada três personagens da política que tendem a ficar nos holofotes por toda a legislatura. E o Planalto pode ver aonde, de maneira explícita, pelo menos dois deles querem chegar.

Nos discursos, nas articulações e nas conversas de pé de ouvido, os deputados Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), Aldo Rebelo (PC do B-SP) e Cândido Vaccarezza (PT-SP), todos da base aliada da presidente Dilma Rousseff, expuseram o tamanho do problema de articulação política que o governo enfrenta. O arco de alianças, que já foi de uma dezena de partidos na campanha eleitoral, ganhou mais cinco adesões depois da vitória.

Foi nesse mar aberto de apoio de todos os tons partidários, de interesses fisiológicos ostensivos e pouca ou nenhuma ideologia definida, que os três centralizaram na semana passada as atenções. Henrique Eduardo Alves, que só pensa naquilo, na campanha para chegar ao comando da Câmara, teme Aldo Rebelo, que passou a ser um pré-candidato sempre temido desde que, em 2005, correndo por fora, ganhou o que Alves mais deseja.

Vaccarezza é um deputado com trânsito superior aos demais petistas entre todas as correntes da Câmara, dentro e fora do PT, mas é um líder atormentado por derrotas desde que assumiu a liderança do governo, no final do segundo mandato do ex-presidente Lula.

Ele estreou com uma derrota acachapante, em fevereiro do ano passado, quando foi votado o projeto do Fundo Social do pré-sal, o primeiro dos quatro projetos do pacote de regulamentação do setor. De lá para cá, Vaccarezza é um líder em que as ações de redução de danos são mais evidentes do que as vitórias explícitas.

Enquanto Vaccarezza sobrevive em meio a uma base elástica, Henrique Eduardo Alves e Aldo Rebelo exercitam-se em estratégias individuais, mas que, pelo menos no Código Florestal, botou os dois na condição de aliados. Aldo e o PC do B convivem mal com o espaço assombrado que um PT naturalmente forte lhes reserva depois de três mandatos presidenciais seguidos.

Alves é um aliado camaleão, um líder que aceitou botar o PMDB ao lado de Dilma na campanha por não ter o seu candidato do coração na disputa, o tucano mineiro Aécio Neves. A tendência, como a votação do Código Florestal mostrou, é que o PMDB votará com o governo quando apenas e tão somente os interesses forem coincidentes.

Henrique Alves

Líder dos "aliados rebeldes"

Em seu 11.º mandato de deputado, o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), traçou um único objetivo pelos próximos dois anos: eleger-se, em 1.º de fevereiro de 2013, presidente da Câmara. E foi com esse foco que o peemedebista subiu à tribuna da Câmara, na noite de terça-feira, e fez um discurso de candidato: falou o que a plateia queria ouvir e, a despeito das pressões do Planalto, manteve a palavra de que o Código Florestal seria votado. Com essa atitude, saiu fortalecido e conseguiu se cacifar como o candidato mais forte à sucessão de Marco Maia (PT-RS).

O deputado conseguiu que a bancada votasse praticamente unida a favor de uma emenda do partido que dá anistia aos desmatadores no Código Florestal. Em um plenário no qual o clima era majoritariamente contra a posição do governo, demonstrou ao seu público interno estar do lado dos deputados, enfrentando o Planalto, que ameaçou demitir ministros peemedebistas em represália à rebelião do partido. "Peço aos meus ministros que não constranjam, até porque não vai adiantar nada. Antes de serem ministros são meus companheiros de partido", disse.

Para o governo, fez também o discurso de fidelidade e de parceria. Lembrou que Michel Temer (PMDB-SP) foi eleito na mesma chapa de Dilma Rousseff. "Não sou aliado do governo Dilma, sou governo Dilma. Eu tenho o vice-presidente, que não foi nomeado, foi eleito. Eu sou o governo de Michel e sou o governo de Dilma; sou governo do PMDB e sou governo do PT", discursou.

No foco de se eleger presidente da Câmara, a posição firme do deputado no processo de votação do Código Florestal foi turbinada pela ameaça do crescimento do deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP). A popularidade alcançada pelo comunista em redutos da base acendeu uma luz amarela no grupo de Henrique Alves.

A despeito de sair chamuscado no conceito da presidente Dilma, ele seguiu o que o plenário no momento lhe exigiu: mostrar a quem servia, ao governo ou à Câmara. E optou em conseguir os votos que lhe darão mais poder de pressão no governo.

Aldo Rebelo

Experiente, discreto, equilibrado

Quatro anos depois de perder a disputa pela presidência da Câmara, o deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) ressurgiu no cenário político nacional como relator do polêmico Código Florestal. Uma emenda ao seu relatório conseguiu explicitar, nestes cinco meses de governo Dilma Rousseff, as disputas camufladas entre o PMDB e o PT, aliados na eleição mas em disputa oculta na tarefa de governar. Os dois partidos ficaram em lado opostos, criando fissuras na base aliada.

Apontados como o "patinho feio" da eterna aliança PT-PC do B, os comunistas desta vez também se rebelaram e ficaram contra os petistas. A bancada de 15 deputados foi praticamente unânime ao acompanhar o relatório de Aldo e a emenda do PMDB que dá anistia aos desmatadores, contrariando orientação do governo. Sem conseguir se encontrar pessoalmente com a presidente Dilma Rousseff durante a longa negociação, Aldo chegou a divulgar uma carta aberta à presidente contestando as críticas de seus ministros.

Aldo se irritou com o Planalto ao ouvir o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), dizer que Dilma considerava "uma vergonha" a emenda com a anistia. Aos berros, microfone em punho, ele pediu ao presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), que interpelasse Vaccarezza.

"Interpele o líder do governo para que confirme ou não se a presidente falou que o que esta Casa está votando é uma vergonha. Tenho o direito de saber isso", gritou. Nas negociações pelo Código, o interlocutor de Aldo foi o ministro Antonio Palocci, que submergiu depois do escândalo sobre seu patrimônio.

Escolhido para relatar o Código Florestal por seu tom conciliador e discreto, Aldo foi o responsável, também, por outro projeto polêmico: o da biossegurança, que dividiu ruralistas, ambientalistas e cientistas. Em seu sexto mandato, Aldo - acusado por alguns de seus companheiros de xenófobo - gosta de se definir como patriota. Com o relatório que fez para o Código, ele conquistou um espaço que o cacifou para eventual candidatura à presidência da Câmara.

Cândido Vacarezza

Um trator em rota de colisão

O processo de votação do Código Florestal pôs o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), em rota de colisão tanto com os líderes da base aliada quanto os de oposição. A derrota humilhante da presidente Dilma Rousseff foi o desfecho de uma negociação mal conduzida junto com a reação à "arrogância" do poder central com seus aliados, representado na tribuna por Vaccarezza.

Se a relação de Vaccarezza com os deputados já não andava boa, seu discurso na tribuna durante a votação do projeto azedou de vez o clima. Vaccarezza, depois de considerar que a emenda ao projeto relatado por Aldo Rebelo (PC do B-SP) e defendido pela expressiva maioria da Casa era uma "vergonha para o Brasil" nas palavras da presidente da República, tratou a Câmara como um quintal do Palácio do Planalto. "A Casa fica sob ameaça quando o governo é derrotado", bradou sob vaias das galerias e de deputados.

Quando o projeto entrou em votação, as divergências já estavam expostas havia ao menos três semanas. Vaccarezza inicialmente se estranhou com o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-SP), por ter marcado a data de votação sem consultá-lo, e com o líder do PT, Paulo Teixeira (SP), por conta das posições antagônicas sobre a proposta. Em seguida, bateu de frente com o aliado e líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN).

O petista e o peemedebista travaram uma queda de braço sobre a data de votação - Vaccarezza insistia em votar medidas provisórias antes do Código Florestal - e depois sobre a emenda defendida por Henrique Alves que permite anistia aos que desmataram ilegalmente. O líder do PMDB articulou, à revelia do governo, um consenso dos partidos em torno da votação do Código. A interlocutores, Henrique acusou Vaccarezza de "agir com vaidade" e "fazer política com o fígado".

A avaliação de aliados é que Vaccarezza acabou se transformando em alvo de boicote da própria base, por conta da demora de Dilma em preencher os cargos de segundo escalão e na liberação de verbas de emendas parlamentares ao Orçamento.