Título: Sem grandes surpresas
Autor: Dantas, Fernando ; Rodrigues, Alexandre
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2011, Economia, p. B1

Em 2010, a economia desacelerou bastante. O PIB começou crescendo a uma taxa anualizada de 9% e fechou a 3%, depois de no terceiro trimestre ter batido em apenas 1,6% anualizados. Os analistas, que já esperavam queda no crescimento em 2011, até mesmo por efeitos estatísticos, passaram a temer desaceleração ainda mais forte.

A composição do crescimento no quarto trimestre de 2010 também gerou apreensão. Puxado pela alta do consumo das famílias, de 10,4% (anualizada), e com o investimento crescendo apenas 2,6% (anualizados), o que derrubou a taxa de investimento para 18% do PIB, ante 19,4% do PIB no trimestre anterior, esse padrão de crescimento gerava dupla preocupação: que o investimento fosse insuficiente para sustentar uma alta forte do PIB e fosse preciso tomar medidas mais fortes para conter o endividamento e o consumo das famílias.

O PIB divulgado ontem corroborou as previsões. Mais do que isso, os resultados afastaram, pelo menos por ora, a preocupação de que o ciclo de investimentos perdera fôlego, com a taxa subindo para 18,4% do PIB. A alta do PIB, de 1,3% ante o trimestre anterior (anualizada de 5,3%), ainda foi acima do potencial, o que sinalizaria a necessidade de novos apertos monetários, mas três outros resultados qualificam essa conclusão. Primeiro, parte dessa aceleração pode refletir o fraco desempenho do segundo semestre de 2010; de fato, os dois setores mais dinâmicos no trimestre, agropecuário e indústria, tinham recuado na segunda metade do ano passado. Assim, ante o mesmo trimestre de 2010, o aumento do PIB foi de moderados 4,2%.

Segundo, o consumo das famílias arrefeceu bastante, com expansão anualizada de 2,4%, bem abaixo do observado em 2010. Por fim, parte relevante da variação do PIB foi explicada pelo acúmulo de estoques, que saiu de -1% do PIB no quarto trimestre de 2010 para 0,4% no primeiro trimestre deste ano. Ainda que essa variável seja muito volátil, não é possível explicar o comportamento do PIB sem levá-la em conta.

Os indicadores para o segundo trimestre têm sido menos positivos, sinalizando desaceleração já em abril. Ainda que fatores fortuitos em parte expliquem esse desempenho, é provável que neste trimestre o PIB cresça mais devagar.

COORDENADOR DE ECONOMIA APLICADA DO IBRE/FGV E PROFESSOR DO INSTITUTO DE ECONOMIA DA UFRJ