Título: Brasil e emergentes viram base para expansão das múltis de infraestrutura
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2011, Negócios, p. B22

Empresas como Alstom, Siemens e General Electric têm investido cada vez mais nos países emergentes - que vêm aumentando seus gastos em setores como transporte e geração de energia - para compensar as perdas com a estagnação dos países ricos

Políticas para promover o desenvolvimento econômico e o combate à pobreza nos mercados emergentes estão gerando lucros, pelo menos para as grandes multinacionais do setor da construção e de infraestrutura no mundo.

Os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e, agora, também a África do Sul) se transformaram no maior canteiro de obras do mundo e estão permitindo que as principais multinacionais do setor compensem em parte as perdas que estão sofrendo com a estagnação dos mercados da Europa, Japão e Estados Unidos.

Nos próximos dez anos, os países emergentes terão de investir mais de US$ 4 trilhões para estabelecer uma nova base para suas sociedades e permitir que suas economias continuem a crescer, segundo o banco Goldman Sachs. O valor é o mesmo que a Casa Branca cortará de seu orçamento na década para reduzir o déficit público.

Não por acaso, a nova realidade está obrigando a cúpula de gigantes do setor de infraestrutura a rever suas estratégias para as próximas décadas. Os cálculos dessas companhias apontam que governos como os do Brasil, Índia, Rússia e China não terão outra opção senão a de investir de forma pesada em infraestrutura, diante da explosão de novas cidades e de uma demanda cada vez maior por energia, estradas e aeroportos.

Só no Brasil, empresas estrangeiras se lançam em uma corrida por contratos públicos avaliados pela Comissão Europeia em 133 bilhões ao ano, ou 13% do PIB nacional. Esses recursos incluem as obras para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, mas também a infraestrutura que o País precisará ter para atender a nova classe média e ainda tornar o País mais competitivo. O cálculo inclui também licitações para os setores de serviços, saúde, educação e telecomunicações, e mesmo contratos militares.

Na avaliação do Banco Santander, empréstimos de mais de US$ 30 bilhões poderão ser dados a empresas no Brasil em 2011 para financiar projetos de infraestrutura. O valor seria recorde. A tendência não se limita ao Brasil. O Banco de Desenvolvimento da Ásia estima que o continente precisará de US$ 750 bilhões até 2020 para atender às novas necessidades de infraestrutura da região. E, isso, sem contar a China.

Planos. Não é por acaso, portanto, que as estratégias de empresas como General Electric, Siemens, Alstom, Holcim e ABB tenham passado por mudanças profundas para abocanhar parte desses mercados.

Recentemente, a francesa Alstom foi uma das que apontaram para essa nova realidade. A terceira maior empresa do mundo da área de equipamentos de geração de energia cortou os dividendos pagos a acionistas pela metade e reduziu os lucros anuais em 62%. O motivo: a estagnação de obras nos EUA e Europa.

O presidente da empresa, Patrick Kron, anunciou o corte de 5,3 mil funcionários em usinas na Europa e Estados Unidos. Mas ele mesmo admitiu que a crise na companhia só não é maior graças aos mercados emergentes. "A atividade é muito mais forte em mercados emergentes", afirmou. Em 2010 e 2011, essas economias foram responsáveis por 60% de todas as novas encomendas e contratos fechados com a Alstom. Há dois anos, os emergentes representavam apenas 35% das encomendas da empresa.

Para essas multinacionais, as políticas de combate à pobreza nos emergentes se transformaram claramente em oportunidade de lucros. Em uma recente entrevista à revista Forbes, o presidente da Siemens, Peter Löscher, admitiu que a explosão das novas megacidades promete garantir a continuidade dos lucros da empresa durante o resto da década. Para sustentar sua tese, usa dados da ONU. Hoje, 51% da população mundial vive em cidades. Em 2050, essa taxa chegará a 70%, o que significa que o êxodo rural será acelerado e que as novas cidades precisarão de investimentos pesados para lidar com essa nova população.

Em uma década, as cidades dos países emergentes ganharão 470 milhões de novos habitantes, e todos vão querer ter água encanada e eletricidade. Hoje, 70% das vendas da Siemens ainda são para os países ricos. "Mas, quando você fala em crescimento incremental, mais de 50% está ocorrendo em mercados emergentes", disse o executivo.

Os cálculos da empresa alemã apontam que o mercado de infraestrutura no mundo gira em torno de US$ 2,8 trilhões por ano. Mas as indicações são de que o crescimento desse mercado nos próximos anos estará principalmente em cidades com mais de 1 milhão de pessoas. A Alemanha tem três cidades desse porte. A Índia conta com 46. "Essa é uma grande oportunidade", afirmou Löscher.

A General Electric, com seus 300 mil funcionários, também aposta nos emergentes. Na América Latina, a companhia aumentou sua receita em 30%, e a meta é de que, nos próximos cinco anos, seja registrada uma alta de 20%. Em uma recente entrevista ao jornal Financial Times, o presidente da GE para a América Latina, Reinaldo Garcia, admitiu que o desafio de infraestrutura existe para quase todas as principais cidades do continente. Mas afirmou que essa situação é um alívio para a empresa. "É um desafio para a população, mas uma maravilhosa oportunidade para a GE", disse.

Um levantamento da empresa indica a dimensão dessa oportunidade: a demanda por energia no planeta vai dobrar em 20 anos e, em grande parte, por conta da expansão dos países emergentes. A GE não esconde que quer estar entre as empresas que abastecerão esse novo mercado.