Título: Fundo de reserva não dá para indenizar nem três empresas
Autor: Mendes, Karla
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2011, Economia, p. B1

Recursos da RGR são de R$ 16 bilhões e somente Furnas, Chesf e Cesp teriam de receber R$ 20 bilhões

O dinheiro que o governo federal tem guardado para indenizar as empresas que deixarem de operar concessões públicas no setor elétrico não é suficiente para indenizar nem três companhias.

Dados obtidos pelo Estado mostram que somente Furnas, Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf) e Companhia Energética de São Paulo (Cesp) teriam a receber cerca de R$ 20 bilhões no caso de não renovação de suas concessões. O fundo administrado pela Eletrobrás para compensar as empresas tem aproximadamente R$ 16 bilhões.

Esse valor corresponde ao saldo de tudo o que foi arrecadado ao longo dos últimos 50 anos com a cobrança de um encargo na conta de luz, denominado Reserva Global de Reversão (RGR). Essa espécie de imposto foi criada exatamente para formar uma poupança para pagar indenizações no caso de reversões das concessões. Mas isso nunca ocorreu.

No fim do ano passado, a RGR foi prorrogada por mais 25 anos, o que corresponde a um ônus de 2% na conta de luz dos brasileiros, sob a justificativa de que o governo não poderia abrir mão do recurso para financiar programas como o Luz para Todos.

Equívoco. A projeção do valor a ser recebido pelas três companhias considerou apenas os ativos de geração e joga por terra a tese de que os investimentos das estatais foram totalmente amortizados, ou seja, as concessionárias não teriam de receber nenhuma indenização e esse benefício poderia ser usado para a redução da tarifa de energia elétrica.

"Os investimentos já estão amortizados, então eles podem cobrar menos", disse o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, há duas semanas.

O consultor Vilson D. Christofari, ex-presidente da Cesp e da Eletronorte, cita o exemplo da usina de Xingó, da Chesf, que entrou em operação em 1997. A concessão expira em 2015 e só 32,33% dos investimentos foram amortizados. "Pode alguém afirmar que o consumidor já pagou pela usina de Xingó?"

Iara Pasian, sócia líder da Deloitte para atendimento das empresas de energia, tem a mesma visão. "Não existe usina totalmente amortizada. Isso é um dos maiores equívocos", criticou. Ela destacou que um setor como o de energia demanda investimentos constantes em manutenção e operação, e esses recursos usados pelas companhias têm de ser remunerados.

O valor total das indenizações que a União teria de fazer para as concessionárias é uma incógnita. Márcio Zimmermann, secretário executivo do Ministério de Minas e Energia, disse que caberá à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) arbitrar os valores a serem pagos para as empresas, caso as concessões não sejam renovadas. "Tem de ver efetivamente o que a Aneel vai reconhecer."

"Esse assunto é o mais complexo e impactante deste ano. E a segurança jurídica é fundamental nesse processo. Se não for dado o tratamento jurídico adequado, esse assunto vai acabar na Justiça", alerta Reginaldo Medeiros, presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel).