Título: Intervenção do BC tem efeito inflacionário
Autor: Andrade, Renato
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/06/2011, Economia, p. B14

Para economista, compra de dólares atenua a variação do câmbio, mas tem efeito colateral

As compras de dólares feitas pelo Banco Central podem gerar um efeito colateral inflacionário na economia brasileira. De acordo com análise feita pelo professor Márcio Garcia, do Departamento de Economia da PUC-Rio, as intervenções conseguem amenizar as variações da taxa de câmbio, mas acabam provocando um aumento no volume de dinheiro que os bancos podem emprestar, dando impulso ao consumo e à alta dos preços.

Para comprar dólares no mercado o BC paga com reais. Ao fazer isso, a taxa de juros diária cai porque há mais dinheiro disponível para ser emprestado, o que reduz o custo - os juros pagos nessas operações. Para trazer a taxa ao patamar definido pelo Comitê de Política Monetária (Copom), o BC vende títulos públicos para enxugar o excesso de dinheiro e, com isso, "esterilizar" a expansão de reais.

O problema identificado por Garcia é que o volume de títulos que o BC precisa vender para reequilibrar a taxa de juros é menor do que o volume de dinheiro usado para comprar dólares. Por isso, a simples intervenção e subsequente enxugamento de reais são insuficientes para evitar o aumento dos recursos disponíveis nas mãos dos bancos.

Isso acontece, segundo Garcia, porque como o País adota um sistema de metas de inflação, as esterilizações conduzidas pelo BC têm como foco o reequilíbrio da taxa de juros e não do montante de dinheiro em circulação no mercado, conhecido no jargão técnico como base monetária. "Restabelecer a taxa de juros ao patamar prévio das intervenções pode não ser equivalente a restabelecer a base monetária para seu nível prévio", pondera o economista com base no modelo apresentado em seu trabalho.

Evidências. De acordo com o professor, o dinheiro em circulação na economia brasileira cresceu 25% em 2010, ou R$ 40 bilhões a mais, ao mesmo tempo em que o BC comprou o equivalente a R$ 80 bilhões em moeda estrangeira no mercado de câmbio. "Essas compras foram um dos principais fatores que explicam o robusto aumento no dinheiro em circulação", argumenta Garcia. "É claro que outras operações do BC afetaram a base monetária, mas "prima facie", parece plausível que a história contada pelo modelo explica ao menos parte do que está acontecendo no Brasil."

A própria adoção, pelo Banco Central, de medidas para conter o ritmo de expansão do crédito é considerada por Garcia como exemplo de que as intervenções no câmbio geram efeitos sobre o volume de dinheiro disponível, que podem gerar os efeitos inflacionários colaterais. "As medidas macroprudenciais tomadas reforçam a ideia de que intervenções esterilizadas devem estar gerando um aumento da demanda agregada, mesmo enquanto o juro definido pelo Copom é mantida no patamar desejado."