Título: Redes sociais inflamam a revolução no Bahrein
Autor: Boussidan, Solly
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/06/2011, Internacional, p. A15

Jovens usam internet para pressionar o governo e informar o que a mídia oficial escondia

Ali tem 29 anos. Sua melhor amiga, uma xiita que anda de saia e não usa véu, chama-se Adawiyah e tem 28 anos. Ambos não revelam sobrenomes por medo da repressão que ronda o Bahrein e já levou dezenas de ativistas e blogueiros à prisão sob diversas acusações. Alguns de seus conhecidos foram torturados. Ambos já receberam ameaças pelos perfis na rede Twitter, usada para divulgar o que presenciam durante os protestos que ocorrem desde fevereiro.

Tanto Ali como Adawiyah fazem parte de uma elite jovem e liberal, educada em universidades da Europa e dos EUA, com trabalhos em multinacionais e bons salários. Ambos têm plena consciência dos riscos que correm ao blogarem ou tuitarem sobre o que vem ocorrendo no país e contradizendo a mídia oficial.

"O que quer que aconteça aqui nos afeta diretamente. Somos um país muito pequeno, mas a nossa riqueza anual é na casa dos bilhões e bilhões de dólares. Esse é um dinheiro que deveria ser investido e entregue ao povo, mas ele míngua e a maior parte da população não vê absolutamente nada. Não temos transparência", diz Ali, inconformado.

Hasan Jamali/APProtesto. Jovens muçulmanas participam de manifestação contra o governo do Bahrein "Um amigo me perguntou porque eu me importo tanto com essa revolução se eu tenho uma vida boa e não me falta nada. Minha resposta é que eu tenho sorte - e isso não é justo, pois muitas pessoas aqui não possuem essa mesma sorte e, apesar de trabalharem muito duro, serem inteligentes, não conseguem progredir, não têm chances - eu poderia muito bem ser uma dessas pessoas", diz Adawaiyah.

Ambos concordam que as principais vantagens das mídias sociais e da internet móvel durante mais um embate no Bahrein são a velocidade com que as notícias se espalham, a habilidade de contradizer a versão oficial do governo e a mobilização de mais pessoas revoltadas, que agora se sentem parte de algo maior e não mais lutando individualmente por aquilo em que acreditam.

"As pessoas não ficam mais isoladas. A mídia social mudou completamente a mentalidade das pessoas e fez elas perceberem que têm uma voz. Você não consegue mais ser um alienado nos dias de hoje, quando o país está em chamas", diz Adawiyah.

"Comecei a tuitar o que estava vendo nos primeiros dias de protesto, quando nada muito pesado estava acontecendo ainda. Eu tinha amigos completamente desligados do que estava ocorrendo e queria mostrar para eles que a situação era muito séria. Meu primeiro tuíte foi quando acordei na madrugada ouvindo tiros", conta Ali. No dia seguinte, ele buscou informações sobre o assunto e não encontrou na imprensa local. "Não podia mais ficar sentado esperando para ler as histórias - tinha de ir ver por mim mesmo", diz.

Segundo os dois jovens, os grandes feitos obtidos pelos blogueiros e tuiteiros que tiveram a mesma atitude foram organizar melhor os protestos e, principalmente, desmentir as informações que o governo divulgava localmente e para o mundo.