Título: Plano Real definiu o futuro das duas redes
Autor: Chiara, Márcia De
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/07/2011, Economia, p. B1

Franceses entraram no País com a inflação em alta e Abilio soube fazer compras certas

Desde o Plano Real, evento que marcou definitivamente o futuro dos grupos Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil, a companhia comandada por Abilio Diniz registrou o dobro do crescimento da rede francesa. A trajetória das duas empresas, que agora pretendem se unir, seguiu em paralelo até meados da década de 90, quando uma série de aquisições mal sucedidas e a manutenção de um modelo de negócio decadente, por parte do Carrefour, quase tirou a multinacional do caminho do Pão de Açúcar.

Hoje com faturamento de R$ 29 bilhões, o Carrefour terminou o ano de 1994 com 33 hipermercados em operação e receita bruta de R$ 3,2 bilhões. A rede chegou ao Brasil em 1975, quando a companhia da família Diniz já liderava o ranking brasileiro de supermercados. Em exatamente uma década, com apenas uma dezena de unidades, os franceses viraram gigantes. "Eles entraram no Brasil no momento certo, com um modelo de loja que caiu como luva para o consumidor, que tentava driblar a inflação", lembra Eugênio Foganholo, diretor da Mixxer consultoria especializada em varejo e bens de consumo. "Eles também foram os primeiros a fazer promoções em cima de preço."

Os hipermercados passaram a ser aliados dos consumidores, que queriam encher a dispensa e estocar o máximo que o dinheiro pudesse comprar naquele momento. Enquanto o Carrefour caía na graça dos brasileiros, Abilio Diniz protagonizava uma briga pelo comando da empresa dentro da própria família. Com a companhia praticamente paralisada, Diniz comprou a parte dos irmãos e assumiu o controle.

Um dos primeiros contra-ataques ao rival Carrefour veio com o lançamento da marca Extra - modelo criado para concorrer com os hipermercados. Mais tarde, o fim da hiperinflação e problemas de gestão dentro do grupo francês trataram de distanciar naturalmente os dois concorrentes. "O hábito de consumo dos brasileiros mudou e com isso mudou também a atração pelos hipermercados", afirma Cláudio Felisoni, coordenador do Programa de Administração de Varejo, da Fundação Instituto de Administração da USP.

O que se seguiu a isso foi uma verdadeira guerra por espaço no mercado. As duas redes partiram para uma estratégia de aquisições em série. Entre 1994 e 2002, o faturamento do Pão de Açúcar cresceu cinco vezes, de R$ 2,2 bilhões para R$ 11,6 bilhões. Os números mostram que, nesse embate, Diniz saiu vitorioso. "As compras do Pão de Açúcar foram muito mais bem sucedidas", lembra Nelson Barrizzelli, professor da Faculdade de Economia da USP. "O Carrefour acabou comprando lojas de vizinhança, sem ter tecnologia para operá-las." A exceção veio mais tarde com a compra do Atacadão, considerada hoje a joia da coroa para a rede francesa.

Dois anos atrás, o Pão de Açúcar se consolidou como maior varejista do País, após a compra do Ponto Frio e a fusão com as Casas Bahia, elevando o faturamento da rede para R$ 36,1 bilhões em 2010. No mesmo período, o Carrefour começou a enfrentar mais uma crise que culminou no fim de 2010 com um rombo de R$ 1,2 bilhão nas contas da operação brasileira.

"Agora, o que estamos vendo, é uma rede muito forte tentando comprar uma empresa em dificuldades", diz Felisoni.