Título: Saúde do líder venezuelano mexe com a cena política
Autor: Lameirinhas, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/07/2011, Internacional, p. A10

O surpreendente retorno do presidente Hugo Chávez a Caracas voltou a mexer com o atribulado cenário político venezuelano, enquanto a incerteza sobre a doença do líder ainda estava sendo digerida. Ao aterrissar na Venezuela, Chávez assegurou estar "bem", mas deixou claro, pouco depois, que essa chegada é "o início do retorno" - o que mantém aberta uma incógnita: o líder permanecerá em Caracas ou voltará a Cuba para continuar seu tratamento?

O problema de saúde de Chávez - que não teve nem o tipo nem a gravidade revelados - poderia comprometer seriamente a capacidade do presidente de liderar a Venezuela e a extenuante campanha eleitoral de 2012. Além disso, o lento e cuidadoso tratamento que, segundo Chávez, terá de ser feito para que ele supere o câncer o obrigaria a modificar seu estilo personalista e sua presença na mídia. A escassa informação faz com que especialistas desconfiem de que Chávez sofreria de um câncer cujo tratamento requer meses de quimioterapia e impõe uma difícil recuperação.

A versão oficial diz que Chávez está em "franca melhora", motivo pelo qual muitos apostam em uma recuperação rápida e no presidente em forma para a campanha de 2012. Desse cenário, o presidente sairia fortalecido por um retorno triunfal que lhe permitiria desacreditar os adversários que especulavam sobre seu possível desaparecimento político. A recuperação rápida ainda devolveria a fama de invulnerabilidade de Chávez, que se beneficiaria também da "cortina de fumaça" que sua saúde lançou sobre os problemas domésticos.

Chávez confessou ter cometido um "erro fundamental" ao não cuidar de sua saúde como deveria. Caso a necessidade de um tratamento agressivo contra uma possível metástase se confirme, o presidente teria de optar entre organizar a campanha da reeleição ou voltar a Cuba durante a reabilitação. O tratamento obrigaria o líder a modificar seu estilo e delegar mais suas funções.

Chávez nunca chegou a nomear herdeiros políticos. Nenhum dos atuais aliados mais proeminentes - o vice, Elías Jaua, o ministro de Energia, Rafael Ramírez, o irmão mais velho, Adán, ou o deputado Diosdado Cabello - teria respaldo e carisma para manter a coesão dos socialistas do país. Um desaparecimento repentino do presidente colocaria em risco acordos energéticos, econômicos e políticos que ele comanda pessoalmente. / REUTERS