Título: Presidente é adepto de gestos teatrais
Autor: Lameirinhas, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/07/2011, Internacional, p. A10

Chávez desembarca como se voltasse de férias, canta para jornalistas e solta frases de efeito

CARACAS - Ao aterrissar em Caracas, depois de um mês em Cuba, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, disse ter feito uma viagem e uma aterrissagem perfeitas. Depois, ao lembrar-se que estava no Aeroporto Internacional de Maiquetía, no Estado de Vargas, e não na capital, cantou uma música em homenagem à cidade para o jornalistas que o esperavam.

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O regresso inesperado de Chávez à Venezuela, depois de um período de convalescência em Cuba, em consequência da retirada de um tumor, é a mais recente reviravolta de um showman contumaz, acostumado a lances dramáticos e a frase polêmicas.

O venezuelano disse que estar em Havana, onde se recuperou da cirurgia realizada no dia 10, ou em Caracas "é estar na mesma pátria". "A grande pátria, a de Bolívar, a de (José Francisco de San) Martín, afirmou Chávez, referindo-se aos ícones da independência latino-americana.

Na noite anterior, os venezuelanos assistiram ao vídeo em que o presidente de 56 anos aparecia debilitado, recuperando-se numa clínica, passeando com duas de suas filhas. Ontem, o país acordou com um novo vídeo em que ele estava extasiado no retorno à pátria, abraçando ministros aliviados. O reaparecimento do presidente seguiu-se às referências entusiásticas de pelo menos um de seus ministros a "uma recuperação quase milagrosa" em Cuba.

O retorno inesperado, um dia antes do bicentenário da independência da Venezuela, lembrou outro retorno dramático e igualmente teatral na carreira movimentada do ex-paraquedista, exibicionista, golpista e vítima de golpistas.

Em abril de 2002, Chávez conseguiu outro regresso, ressurgindo triunfante como chefe de Estado resgatado e restaurado no poder por soldados leais a ele, depois de ter sido temporariamente afastado do poder por golpistas militares e civis. Ele surgiu na mesma sacada do Palácio de Miraflores de onde saudou seus seguidores exultantes.

Quando ele anunciou em Havana, na semana passada, a operação para a extração de um tumor, falou em volta do "abismo", dando a impressão de que um dos políticos mais extraordinariamente confiantes do mundo se dera conta de sua mortalidade. Mas a transmissão do vídeo pela TV estatal, horas antes de seu surpreendente regresso, mostrou Chávez radiante, em trajes esportivos com as cores berrantes amarela, azul e vermelha da bandeira venezuelana, discutindo a obra do filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, Assim falou Zaratustra - com as duas filhas, inquietas ao seu lado.

Chávez comentou a "tese do Super-homem" de Nietzsche, com uma série de referências a suas figuras históricas favoritas: o guerrilheiro argentino-cubano, Ernesto Che Guevara, o poeta e combatente da independência cubana, José Martí, e o próprio herói da independência venezuelana, Simon Bolívar. / REUTERS

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