Título: Tribunal internacional pede prisão de membros do Hezbollah no Líbano
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Fonte: O Estado de São Paulo, 01/07/2011, Internacional, p. A12

Um tribunal criado pela ONU indiciou e pediu ontem a prisão de quatro membros do Hezbollah, organização xiita e um dos principais grupos políticos do Líbano. Eles são suspeitos pelo atentado que matou o ex-primeiro-ministro libanês Rafik Hariri em 2005. A decisão aumenta o temor de um novo confronto entre as facções pró-Ocidente e grupos próximos à Síria e ao Irã.

Na própria ONU, o temor era de que a acusação contra o Hezbollah jogasse o país em mais uma crise política e aumentasse o risco de violência. Por isso, os nomes dos indiciados deveriam ter sido mantidos em sigilo, o que não ocorreu.

No início de 2011, foi justamente o debate sobre o tribunal da ONU que fez o governo cair e obrigou o Líbano a formar um novo gabinete. Entre os envolvidos na morte de Hariri estão alguns dos membros da cúpula do Hezbollah, considerado como terrorista pelos EUA.

A Associated Press afirma ter tido acesso à lista. Um dos nomes é o de Mustafa Badreddine, vice-comandante militar do grupo. Ele é cunhado do ex-comandante do Hezbollah, Imad Mughniyeh. Outro citado pela AP é Salim Ayyash, libanês-americano que teria sido o responsável por organizar o ataque. O mandado de prisão também seria contra Hasan Aineysseh e Assad Sabra.

O tribunal já vinha dando indicações de que a culpa recairia sobre o Hezbollah. No entanto, o grupo não aceita a acusação. Hassan Nasrallah, líder do grupo xiita, alertou que a corte não passa de um "projeto americano-israelense para enfraquecer a resistência" e "semear a discórdia no Líbano".

Há um ano, Nasrallah afirmou que "cortaria a mão" de qualquer um que tentasse prender um dos membros do grupo. Em um país onde a estabilidade é frágil, a intenção da ONU era de que os nomes dos envolvidos permanecessem em sigilo justamente para evitar protestos nas ruas e o aumento da tensão.

O governo libanês tem agora um mês para cumprir o mandado de prisão. Se isso não ocorrer, a corte promete tornar os nomes públicos - embora ninguém saiba agora qual será o procedimento após a divulgação extraoficial dos indiciados.

"O governo libanês deve se comprometer a cooperar com a corte internacional, deter os suspeitos e entregá-los à Justiça", afirmou Saad Hariri, filho de Rafik e ex-premiê do Líbano. Em janeiro, Hariri não aceitou a pressão do Hezbollah para rejeitar a decisão do tribunal. Em resposta, 11 ministros de seu gabinete ligados ao grupo renunciaram e ele foi obrigado a deixar o cargo.

A investigação toca em um dos pontos de maior conflito na sociedade libanesa: o papel do Hezbollah. O grupo é o de maior poder político e militar no país e a acusação contra seus membros ameaça soprar novamente no Líbano os ares da guerra civil.

Outro temor é o de que a decisão reabra os conflitos com a Síria, acusada inicialmente por envolvimento na morte de Hariri. Agora, a decisão deve polarizar mais uma vez o país. De um lado, o Hezbollah com o apoio sírio e iraniano. De outro, aliados de Hariri, com o apoio dos EUA e da Arábia Saudita. Ontem, Washington pediu que o grupo se submetesse ao tribunal internacional.

Coube ao atual primeiro-ministro libanês, Najib Mikati, acalmar as tensões. Mikati é apoiado pelo Hezbollah, mas quer manter boas relações com o Ocidente. Ontem, ele afirmou que defenderá, acima de tudo, "os interesses do Líbano" e emitiu sinais na direção dos dois lados.

"Indiciamentos não são veredictos", afirmou Mikati. "Precisamos agir de forma responsável e pensar com cuidado para que ninguém use essa oportunidade para desestabilizar o país. A paz deve estar acima de todos os debates. Não podemos deixar que esse indiciamento divida o Líbano."