Título: Anvisa defende redução do teor de iodo no sal
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/07/2011, Vida, p. A15

Segundo agência, ingestão excessiva da substância pode causar tireoidite; especialista, porém, diz que a falta é ainda mais nociva

Uma proposta para reduzir a quantidade de iodo no sal brasileiro foi colocada ontem em consulta pública pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A medida, feita a pedido do Ministério da Saúde, é uma reação à mudança do hábito alimentar do brasileiro, que passou a usar mais o tempero em sua dieta. Com o maior consumo do sal, a quantia de iodo adicionada ao produto deve ser ajustada, defende o ministério.

"A medida pretende reduzir o risco de uma ingestão excessiva de iodo, que, de acordo com estudos, pode levar à tireoidite de Hashimoto", afirmou a especialista em vigilância da Anvisa, Paula Ferreira. A doença ocorre por um erro no sistema imunológico. O organismo passa a atacar a tireóide, levando ao hipotireoidismo. Pacientes com o problema apresentam cansaço, ganho de peso e fadiga crônica.

O Ministério da Saúde calcula que o consumo médio de sal pelo brasileiro, incluindo alimentos processados e preparados fora de casa, é de 12 gramas - mais que o dobro do limite preconizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para populações com esse perfil de consumo, a OMS recomenda que a quantidade de iodo adicionada ao sal deve variar entre 20 e 40 mg por quilo. Anualmente, a norma da Anvisa determina índice entre 20 e 60 mg. A proposta reduz para 15 a 45 mg.

A resolução deve ficar em consulta pública por 60 dias. Para Laura Ward, professora da Unicamp e diretora do Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de Endocrinologia, a proposta tem um princípio falso. "O ideal seria trabalhar para uma redução da ingestão de sal, não ajustar o teor de iodo", diz. "O consumo de sal no País é extremamente elevado, algo que precisa ser corrigido. Mas não há garantias de que em todas as regiões se faça uso excessivo."

Ela avalia que, para quem usa o tempero de forma moderada e mora distante do litoral, há o risco do ressurgimento de outro problema grave: o cretinismo. A doença, provocada pela deficiência do iodo durante a gestação, pode fazer com que o sistema nervoso central do feto não se desenvolva de forma adequada.

A estimativa é de que um terço das crianças que não recebem a quantia adequada do iodo durante a gestação desenvolve o problema e outro terço, deficiência cognitiva. O bócio, por sua vez, é uma doença provocada pela falta do iodo em adolescentes e adultos. "Foi por causa das duas doenças que a adição do iodo ao sal começou a ser feita. Atualmente, não há casos registrados desses problemas no País", conta Laura. Ela teme, no entanto, que a redução dos teores de iodo no sal aumentem o risco do ressurgimento das doença. "Será tirar de um santo para colocar em outro", compara.

Laura reconhece que a incidência da tireoidite de Hashimoto tem aumentado no Brasil e em outras partes do mundo, como países da Europa e África, mas afirma que o consumo excessivo de iodo não é a única hipótese para o aparecimento da tireoidite. "Stress, exposição à radiação ionizante e uso de produtos com bisfenol também estão ligados à doença", diz. Na Sociedade Brasileira de Endocrinologia, ela vai defender o envio de um documento com críticas à redução.

Acima do limite:

12 gramas é a média diária de consumo de sal do brasileiro

5 gramas é o limite máximo diário de consumo de sal recomendado pela OMS