Título: Na Grécia, Clérigo é servidor público
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/07/2011, Economia, p. B8

Corte no funcionalismo não deve chegar à Igreja

Dentre os cerca de 1 milhão de funcionários civis e militares da Grécia estão todos os clérigos da Igreja Católica Ortodoxa, um pessoal que dificilmente será atingido pelo plano do governo de cortar 150 mil postos públicos.

Diante do Patriarca, todo primeiro-ministro jura fidelidade à Constituição do país com dois dedos sobre a Bíblia. Essas são idiossincrasias de um país que, na avaliação do professor da Universidade de Chipre, Leonidas Vatikiotis, tem pouca afinidade cultural com a Europa Ocidental. A Grécia, para ele, podia estar no Oriente Médio.

Segundo Vatikiotis, essa situação peculiar explica, em parte, porque a Igreja Ortodoxa se mantém tão silenciosa diante da recessão, do risco de moratória do país, do desemprego de mais de 16% e do aumento da pobreza.

Além disso, a Igreja é uma das maiores proprietárias de terrenos e de empresas da Grécia e teme o confisco de seu patrimônio no plano de privatizações.

Do Leste do Mediterrâneo, a Grécia não recebeu apenas a herança cultural. Também incorporou vícios na formação de um Estado que, embora estruturado conforme os conceitos modernos, ainda se mostra ineficiente e dominado pela corrupção, pelo nepotismo e pelo clientelismo.

A máquina de arrecadação de impostos da Grécia não é capaz de atingir todos os potenciais contribuintes, em um país de apenas dez milhões de habitantes, no qual a evasão fiscal é a regra. Os impostos criados, em alguns casos, viram alvo de burla e de piada.

No ano passado, como meio de aumentar a receita, o governo criou um inusitado imposto sobre piscinas. A pedido da Grécia, a presença desse artigo de luxo passou a ser rastreada por satélites europeus. Mas os contribuintes apressaram-se em plantar árvores já crescidas ao redor das piscinas para escondê-las e evitar o novo tributo.

Estudantes costumam se filiar a um dos dois grandes partidos - o Socialista (Pasok) e a Nova Democracia - para conseguir um emprego público.

No dia a dia dos gregos, costumes curiosos são preservados, como o de não reabrir o comércio depois da parada para o almoço e a sesta nas segundas e quartas-feiras e nos sábados. No centro de Atenas, a regra é quebrada por causa do movimento de turistas - com exceção das lojas de artigos religiosos. Com a crise, o costume de quebrar pratos nas festas caiu em desuso. Capazes de rir das próprias tragédias, os gregos brincam estar prontos, agora, para quebrar a Europa.