Título: BCE garante acesso de Lisboa a crédito
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/07/2011, Economia, p. B8

Banco Central Europeu suspendeu exigências mínimas de classificação para os papéis da dívida portuguesa para evitar avanço da crise

A Europa desautorizou as agências de rating e blindou, pelo menos de forma temporária, Portugal. Ontem, o BC europeu garantiu o acesso de Lisboa a créditos e assegura assim a liquidez nas economias periféricas. Apesar da medida positiva em relação a Portugal, o BCE voltou a elevar as taxas de juros, em uma ação que pode afetar ainda mais a recuperação das economias da Grécia, Espanha, Irlanda e Itália, além de Portugal.

Ontem, o Banco Central Europeu suspendeu as exigências mínimas de classificação para os papéis da dívida portuguesa que um banco pode vender. A medida foi tomada depois que a moeda comum e o risco país das economias periféricas da Europa sofreram um terremoto na quarta-feira.

A agência de classificação de risco Moody"s havia rebaixado a nota de Portugal para junk (lixo), o que fez reabrir o temor de uma contaminação da crise da dívida. Governos europeus responderam de forma dura contra as agências, acusando de tentar desestabilizar os mercados.

Um dia depois dos ataques verbais, foi a vez do BCE lançar uma operação para desautorizar as agências. O sinal do BC europeu foi de que está comprometido em garantir a liquidez dos mercados periféricos a qualquer custo.

O presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, também se somou ontem às críticas, alertando que elas são "cíclicas" e, por conta do oligopólio, seu trabalho não é adequado. Moody''s, S&P e Fitch controlam 90% do mercado mundial.

Ao aceitar a dívida portuguesa e deixar sem efeito concreto o rebaixamento da nota da Moody"s, o BCE conseguiu dar pelo menos por um dia um balão de oxigênio para Portugal. Os mercados reagiram quase que imediatamente. As bolsas europeias e o euro terminaram o dia em alta e o risco país das economias periféricas cedeu.

Se não bastasse a medida que blinda Portugal, Trichet ainda fez questão de elogiar em sua coletiva de imprensa os esforços de Lisboa para colocar sua dívida em ordem. Para ele, o governo português está tomando medidas de austeridade que vão "bem além" do que o FMI e a UE haviam exigido.

Juros. Mas nem tudo o que Trichet anunciou foi motivo de comemoração. Ontem, o BCE subiu as taxas de juros para 1,5%, em uma alta de 0,25%.

A Europa vive um dilema. De um lado, sofre com a pressão inflacionária, principalmente por conta dos preços de alimentos em alta. Mas, para segurar a inflação, precisa aumentar as taxas de juros, o que na prática esfria a economia. A inflação europeia está em 2,7%, acima da meta de 2%. Para Portugal, Grécia, Itália, Irlanda e Espanha, que penam para sair ainda da recessão, a elevação das taxas de juros para lutar contra a inflação é um peso extra que encarece a disponibilidade de crédito.

Ontem, Trichet optou por priorizar a luta contra a inflação em detrimento da recuperação das economias em dificuldades. "É essencial que os desenvolvimentos nos preços não deem lugar a uma pressão inflacionária mais ampla no médio prazo", disse.

Default. Trichet ainda aproveitou para colocar uma pressão extra sobre os periféricos e alertou os governos de toda a Europa que o BCE não aceitará reestruturações das dívidas ou uma moratória ou suspensão de pagamentos das dívidas. "Nossa mensagem é de que não podemos ter um default seletivo. Não podemos ter um default e ponto final", alertou.

O recado de Trichet é direcionado a alguns governos europeus que acreditam que não haverá outra solução senão o reconhecimento de que a Grécia não terá como cumprir suas obrigações. C