Título: Se der todo o dinheiro, não mataremos você
Autor: Lameirinhas, Roberto
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/07/2011, Internacional, p. A21

Repórter do 'Estado' sofre sequestro relâmpago ao desembarcar na Venezuela; crimes são rotina em Caracas

O anúncio chegou cerca de 15 minutos depois de iniciada a viagem do aeroporto de Maiquetía até Caracas. "Não somos taxistas. Nada vai acontecer a você se você colaborar e nos dar todo o seu dinheiro", disse ao repórter do Estado o senhor de cerca de 60 anos que, uniformizado como motorista, o abordara oferecendo transporte na frente do balcão de "táxis oficiais". "Se você fizer qualquer movimento brusco, vamos meter-lhe um tiro na cabeça e deixá-lo aqui."

O carro, um Meriva preto - modelo muito usado pelos taxistas verdadeiros em Maiquetía -, quase voava a mais de 150 quilômetros por hora na autopista ladeada por vias laterais ermas, quase invisíveis à noite. O ladrão que ia ao volante mantinha um revólver no colo. Gordo, quase não falava e mantinha alto o colarinho da camisa. O outro, antes de passar para o banco de trás para revistar o repórter e tirar-lhe o dinheiro, mostrou outra arma no porta-luvas do carro.

"Não queremos computador, nem relógios, nem anel ou aliança. Apenas passe seu dinheiro e não vai te acontecer nada. Mas se você tentar qualquer gracinha, morre. Pense na sua família e conclua que não vale a pena nos enganar", ameaçou, tirando o tênis do repórter em busca de mais dólares, além dos US$ 1.600 que estavam na carteira.

A tensão se prolongou por mais de meia hora. O assaltante parou o carro em um semáforo e, com um celular, estourou um flash perto do rosto do repórter. "Esta foto é para garantir que você não vai procurar a polícia. Sabemos em que hotel você está e vai se arrepender se tentar bancar o esperto", advertiu.

"Desça quietinho e passe por trás do carro", ordenou o assaltante numa rua sob um dos viadutos. O repórter obedeceu e notou que o carro não tinha a placa traseira. A passagem pela delegacia serviu só para o registro da ocorrência. O delegado nem sequer perguntou qual era o carro ou qual a aparência dos assaltantes.