Título: UE admite recomprar títulos da dívida grega
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/07/2011, Economia, p. B10

Divididas entre calote parcial e contribuição voluntária, Alemanha e França podem ceder a um ''Plano Brady'' à europeia

Diante do impasse sobre a "participação" de investidores privados no pacote de ? 100 bilhões, os europeus negociam agora uma alternativa ao default parcial, proposto pela Alemanha, e à "contribuição voluntária", defendida pela França. À procura de um denominador comum, a União Europeia pode autorizar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (Feef) a adquirir em massa os títulos da dívida grega no mercado, pagando seu valor de face.

Na prática, a medida significaria a "federalização" da dívida da Grécia, que seria recomprada com base em recursos repassados pelos vizinhos de bloco a Atenas. Essa é a preferência do governo grego, que evitaria assim a falência. Agências de rating advertiram a Europa nos últimos 15 dias que tanto o default (calote) parcial, seguido de reescalonamento, quanto a "contribuição voluntária", que viabilizaria o roll over da dívida, seriam considerados moratória "de facto".

Encurralada, a UE vem estudando com mais profundidade desde a segunda-feira a recompra dos títulos da dívida grega já emitidos. A medida exigiria a modificação do estatuto do Feef, que até aqui não é autorizado a realizar tais operações. Mas, com o impasse com a França sobre o default, a resistência da Alemanha caiu.

A pista de que o tema vem sendo tratado foi dada, entre outros, pelo primeiro-ministro grego, George Papandreou. "É positivo que há alguns dias os parceiros da Europa discutam cada vez mais uma solução conjunta", afirmou, sem revelar que medidas seriam. Os debates em torno da alternativa seriam a razão pela qual os chefes de Estado e de governo da União Europeia não convocaram a cúpula extraordinária para debater o novo plano de socorro à Grécia, de ? 100 bilhões.

A iniciativa também teria sido discutida em Roma, ontem, entre representantes de Bruxelas e do Banco Central Europeu (BCE) com executivos do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), que representa o sistema financeiro.

Nova estratégia. Se for adotada, a recompra de obrigações representará uma mudança de estratégia na Europa e permitirá à Grécia pagar por suas dívidas o valor de face, sem a desvalorização de 45% exigida pelos investidores privados em troca dos papéis com dez anos de validade.

Para obter os recursos, o Feef seria autorizado a emitir mais bônus europeus, classificados como grau de investimento pelas agências de rating. Em síntese: a Europa lançaria ao mercado títulos com classificação AAA para comprar obrigações CCC da Grécia. Para tanto, a UE estuda elevar os recursos próprios do Feef, hoje de ? 440 bilhões.

Outra possibilidade seria a renegociação entre o Feef e a Grécia, que trocaria os títulos já emitidos por novos, com prazos de validade mais longos e pagando taxas de juros mais baixas. O "swap" entre as obrigações gregas e novos títulos com maturidade mais longa seria uma espécie de versão europeia do Plano Brady - empregado nos anos 80 na América Latina, inclusive no Brasil. As duas hipóteses alternativas em estudo foram levantadas pelo professor de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Ernesto Lozardo, em reportagem do Estado em maio.

"Com essa fórmula, não há problema com as agências de rating", explica Jean-François Robin, analista de obrigações do banco francês Natixis.

Além disso, a alternativa recolocaria a Grécia no mercado privado desde já, e não em 2014 - previsão atual mais otimista. Como todas as operações do gênero, entretanto, a recompra de títulos precisa atrair a participação de investidores privados.