Título: A queda rápida da guilhotina
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Fonte: O Estado de São Paulo, 19/07/2011, Internacional, p. A10

O escândalo Murdoch está se revelando um caso excepcional. Mal nasceu e já tem uma série de ramificações. Avança a uma velocidade avassaladora, com revelações em cascata e demissões de personagens intocáveis. Trata-se de um escândalo colossal. No início, dizia respeito à imprensa e aos estranhos jornalistas do império Murdoch, de preferência os que atuam naquela dita imprensa marrom, do tipo do News of the World, que foi fechado rapidamente.

Imediatamente, outras áreas foram atingidas pela onda de choque: em primeiro lugar, os meios políticos nos seus mais altos níveis, a começar pelo primeiro-ministro David Cameron, que estava ligado a Murdoch. Essas ligações entre Murdoch e Cameron evidentemente caíram do céu para o novo líder do opositor Partido Trabalhista, Ed Miliband, que até então tinha dificuldade para se impor. Por fim, além do círculo político, também foi atingida a polícia, o coração da Scotland Yard.

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O fato mais surpreendente e significativo é que as pessoas atingidas pela onda nauseabunda do escândalo não opõem uma longa resistência. Elas caem como pinos de boliche. Comumente, nestes casos, os suspeitos defendem-se com unhas e dentes, resistem semanas, meses ou anos, antes de afundar. No caso Murdoch, as sanções caem como uma lâmina sobre a nuca de um guilhotinado e no mesmo instante.

É o caso da ex-diretora do News International, a implacável, exuberante e temida Rebekah Brooks. Na sexta-feira, ela teve de se demitir do cargo, sob suspeita de "corrupção". No domingo, foi presa e logo depois liberada.

O mais espantoso é que o chefe da Scotland Yard, Sir Paul Stephenson, anunciou sua demissão no domingo, chorando. Seu pecado foi ter como assessor na área de comunicações um sujeito chamado Neil Wallis, ex-redator-chefe assistente do News of the World. Ao mesmo tempo, fomos informados de que o chefe da Scotland Yard, teve a felicidade, quando convalescente, de se hospedar gratuitamente com a mulher num dos spas mais luxuosos do país, cuja promoção era uma das tarefas do mesmo Wallis. A rapidez dos que se lançaram à caça nos leva a pensar que, na realidade, o dossiê montado contra o tentacular Murdoch é pesado e praticamente indefensável.

Há uma terceira característica que confere ao escândalo Murdoch um estilo ao mesmo tempo universal e simbólico: estamos diante de uma família enorme e terrível, uma família que está certamente unida, por um objetivo comum (dinheiro, conquista do poder, dominação etc...), e também, dividida entre os diferentes ramos do "clã", menos dedicados à ternura e ao amor da família do que a ódios mortais suscitados pela ganância e ciúme.

Aqui vai um vislumbre do "ninho de cobras" que é a família do magnata australiano, ou suas famílias, pois ele se casou três vezes. Ele se separou da primeira mulher em 1966. Sua ex-mulher, Prudence McLeod, não exerce nenhuma responsabilidade no grupo, mas exige uma fatia do bolo.

Em seguida, há o grupo composto por Wendy, a terceira mulher de Murdoch, com a qual se casou em 1999, e por suas duas filhas, Grace e Chloe. A bela Wendy, nascida na China, dona de uma personalidade brilhante, tentou, há alguns anos, dar um "golpe", mas quebrou a cara ao tropeçar nos filhos do segundo casamento de Murdoch - Elizabeth, Lachlan e James.

Evidentemente, os três não são pessoas que se deixem passar a perna sem se defender. O mais jovem, James, conseguiu suplantar os irmãos. Mas todos os três são "agressivos, implacáveis, determinados e resistentes, iguaizinhos ao pai", segundo o biógrafo de Murdoch, Michael Wolff. É ele que nos revela a "regra de ouro" que os três respeitam: "Matar ou ser morto".

Estes ódios entre os três ramos da família Murdoch ou mesmo entre os membros de cada ramo, surpreendem a nós, que pertencemos a uma humanidade comum e somos dotados de uma pequena psicologia um pouco sem graça, um pouco "barata", um pouco delicada. Como explicá-los? Pelo caráter do patriarca e dos seus descendentes? É claro. E também por um pequeno detalhe: em 2010, o faturamento do império Murdoch cresceu e chegou a US$ 32,7 bilhões. / TRADUÇÃO AN