Título: Tea Party criou dificuldade para Obama
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/08/2011, Economia, p. B1-7

Polêmica sobre o aumento do teto para endividamento surgiu por demanda de simpatizantes da facção mais à direita do Partido Republicano

Carolyn Kaster/APDifícil de engolir. Obama após comunicar acordo na Casa Branca: governo caiu na armadilha As idas e vindas nas negociações sobre a crise da dívida dos Estados Unidos deixaram claro como o Congresso americano se tornou refém do Tea Party, a facção mais à direita do Partido Republicano. Por extensão, também o governo de Barack Obama acabou caindo na armadilha do grupo criado em 2009 para se opor ao aumento de impostos e exigir a redução do rombo fiscal do país.

Segundo Thomas Mann, sócio sênior do Brookings Institution, a crise tem sido orientada pelos princípios e demandas não negociáveis dos simpatizantes do Tea Party. "Eles estão perfeitamente dispostos a empurrar o país para a suspensão de pagamentos se suas propostas de corte de gastos públicos e de redução de tributos não forem aceitas, mesmo que suas ambições nas eleições de 2012 sejam prejudicadas", afirmou Mann ao Estado.

A própria polêmica em torno do limite para o endividamento federal dos Estados Unidos surgiu por pressão de deputados e senadores eleitos em 2010 pelo Tea Party e de simpatizantes da causa.

Desde a criação desse teto, em 1917, o aumento da cifra (hoje em US$ 14,3 trilhões) havia sido resultado de simples processos de tramitação no Congresso. Desde 1940, houve 90 elevações automáticas. Em boa medida, porque a elevação desse limite não significa a autorização para gastos adicionais do governo federal, mas despesas previstas no orçamento, aprovado pelo Congresso.

Grupo de terça-feira. Desta vez, a mudança significativa se deu no Congresso, com as eleições de novembro de 2010. Primeiro, com o domínio republicano da Câmara. Segundo, com a eleição de 17 autênticos representantes do Tea Party. Terceiro, com a maioria dos republicanos sensibilizada pelo discurso da direita radical.

Os 45 republicanos moderados, neste momento, estão acantonados no chamado "grupo de terça-feira", uma referência ao prazo máximo para o acordo sobre o limite da dívida federal.

Um dos primeiros caciques políticos a perceber o poder da nova facção foi o presidente da Câmara dos Deputados, John Boehner. Sua proposta de aumento do limite de endividamento - aprovada na Câmara e rejeitada pelo Senado na sexta-feira passada - refletiu em grande medida as convicções do Tea Party.

Concessões. Nos últimos dois dias, o senador Harry Reid, líder da maioria democrata na Casa, retirou de sua proposta todos os elementos rejeitados pelos republicanos, sobretudo os do Tea Party, no esforço de angariar os 60 votos necessários para a sua aprovação.

Reid limou o aumento de tributos e até mesmo o fim de reduções fiscais para os americanos mais abastados e as grandes empresas - questão medular para os democratas e para o presidente Barack Obama.

Ele não negociou sozinho com a oposição. Reid teve a seu lado o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, e o aval do próprio Obama para todas as concessões presentes no seu texto. Nesse sentido, pode incorporar uma ideia semelhante à da proposta de Boehner, antes rechaçada pela Casa Branca, para o aumento do teto da dívida pública federal.

Trata-se da elevação em duas etapas, medida que não ofereceria a Obama a segurança de atravessar o ano eleitoral de 2012 sem a ameaça de mais uma suspensão de pagamentos federais. O presidente concorre à reeleição no ano que vem.

COMO FICOU

O acordo entre os líderes do Senado e da Câmara dos Deputados dos EUA foi o resultado de quase 24 horas de negociação. Teve como base a proposta do senador democrata Harry Reid, mas foi alterado drasticamente por pressão dos republicanos.

Teto da dívida: O texto prevê o aumento de US$ 2,4 trilhões no limite de endividamento do governo federal americano, hoje de US$ 14,3 trilhões. Porém, em duas etapas, como a Casa Branca resistia a aceitar.

Cortes de despesas: O governo já se comprometeria com cortes de US$ 927 bilhões, nos próximos dez anos, nos gastos de agências federais, como as de saúde para idosos e carentes e a Previdência Social, e do Pentágono.

Aumento de impostos: Não ocorreria em um primeiro momento.

Comitê bipartidário: O grupo de 12 congressistas, dos dois partidos, será criado em novembro para avaliar a aplicação do ajuste fiscal e fazer novas recomendações. Seu objetivo inicial será reduzir o déficit primário a 3% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2010, foi de 8,92% do PIB.