Título: A verdadeira carência: crescimento
Autor: Milanese, Daniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/08/2011, Economia, p. B4

Seria surpreendente se o crescimento econômico fosse rápido para reduzir o desemprego, mesmo a 8,5%,

Enfim Washington chegou a um acordo que eleva o limite da dívida e evita um default que teria sido um constrangimento nacional e uma catástrofe econômica e geopolítica. As forças que costuraram o acordo são multifacetadas e as reações também. A minha tem alguns elementos.

Alívio. Não haverá default; não haverá, no curto prazo, uma austeridade prejudicial à economia; não haverá um ataque aos programas de proteção social centrais do país ou ao sistema de saúde universal; e não haverá uma repetição, pelo menos por 15 meses, do recente e abjeto espetáculo. Isso tudo estava pendente alguns dias atrás. Não é pouca coisa o governo ter conseguido um acordo que não causa nenhum dano imediato.

Cinismo. Observadores projetariam déficits orçamentários americanos maiores nos próximos exercícios fiscais que não teriam previsto alguns meses atrás. A previsão econômica se deteriorou, e é razoável estimar que uma redução de 0,5% no crescimento médio nos próximos 10 anos acrescentaria mais de US$ 1 trilhão à dívida nacional em 2021.

Apesar das disposições sobre a redução de gastos na faixa de US$ 1 trilhão, os acordos alcançados terão um pequeno impacto nos gastos reais da próxima década. O acordo confirma os níveis baixos de gastos já negociados para 2011 e 2012, e limita os gastos de 2013. Além disso, as consequências são imprevisíveis - o Congresso vota em gastos discricionários anualmente e o Congresso atual não pode limitar ações futuras. Claro, há tetos e ameaças de sequestro no acordo da dívida, mas eles quase certamente serão reformulados em 2013.

Notavelmente para um assunto tão significativo, o acordo pede uma "supercomissão" que procurará reduzir o déficit em US$ 1,2 trilhão, mas não há acordo sobre a base de referência. Ela inclui ou exclui os cortes de impostos de Bush? Inclui ou exclui as extensões de benefícios fiscais e o acerto anual para um imposto mínimo alternativo? As disputas sobre a base de referência são confusas, mas altamente consequentes. Se for adotada uma base supondo a saída gradual dos cortes de impostos de Bush, não haverá motivação para garantir a rejeição dos cortes de impostos de altas rendas porque isso não contará para a meta. Ou, para tornar a redução do déficit mais fácil, uma base seguindo a política corrente poderia ser adotada. Isso ameaçaria a não extensão dos cortes de impostos às altas rendas de Bush com uma alta de impostos de US$ 1 trilhão.

Ansiedade econômica. As questões que pressionam os Estados Unidos têm muito mais a ver com emprego e um déficit de crescimento do que com um déficit orçamentário excessivo. Considerem que uma única estatística econômica ruim - a pesquisa com gerentes de compras no setor manufatureiro - desta semana mais que eliminou todos os avanços do mercado acionário resultantes do afastamento do risco de default, e que os rendimentos dos bônus atingiram novos pontos mínimos no momento do máximo perigo aparente sobre o limite da dívida.

No rumo político corrente, seria surpreendente se o crescimento fosse suficientemente rápido para reduzir o desemprego, mesmo a 8,5%, até o fim de 2012. Uma retirada de estímulos fiscais ocorrerá quando os cortes de impostos na fonte expirarem no fim do ano. Com o crescimento em menos de 1% no primeiro semestre do ano, a economia está efetivamente estagnada e enfrentando a perspectiva de choques de uma crise financeira europeia, altas súbitas dos preços do petróleo e quedas da confiança de empresas e famílias.

Em breve, o alívio cederá lugar ao alarme sobre o futuro dos Estados Unidos. Entre todas as maquinações futuras, duas questões se destacam: primeiro, o método mais fácil de redução do déficit disponível é a não extensão dos cortes de impostos sobre altas rendas de Bush. O presidente Obama devia deixar claro que não aceitará a extensão em nenhuma hipótese. A clareza sobre esse ponto de 1 trilhão de dólares, somada a uma reforma muito modesta nos benefícios sociais, será suficiente para atingir as metas de redução do déficit.

Segundo, é fundamental que o corte do imposto na fonte seja estendido e que outras medidas, como a manutenção da infraestrutura e a extensão do seguro-desemprego, sejam tomadas para estimular a demanda. Ainda há tempo para confirmar a máxima de Churchill de que os Estados Unidos sempre fazem a coisa certa depois de esgotarem todas as alternativas. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

É PROFESSOR E EX-SECRETÁRIO DO TESOURO DOS ESTADOS