Título: Republicano suspende apresentação de proposta para dívida por falta de apoio
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/07/2011, Economia, p. B6

Ala conservadora da oposição americana exigia que Boehner, presidente da Câmara, fosse mais radical no corte de gastos do governo

O Congresso dos Estados Unidos mostrava-se ontem dividido e incapaz de aprovar um plano de consenso para aumentar o teto da dívida pública, hoje de US$ 14,3 trilhões, e evitar a suspensão dos pagamentos federais. O prazo para que os parlamentares cheguem a um acordo expira na próxima terça-feira.

Desafiado pela ala da direita radical do Partido Republicano e sem os 218 votos necessários, o presidente da Câmara dos Deputados, John Boehner, suspendeu a apresentação de sua proposta ao plenário no fim da tarde. Até o fechamento desta edição, a votação não havia começado.

O nervosismo era visível em cada trincheira. Ao longo do dia, frases típicas de filmes de cowboy, comparações a criaturas literárias, ameaças de Papai Noel magro neste ano e até coalizão no baixo clero emergiram do Parlamento dos EUA e da Casa Branca. Mas nem mesmo um acordo entre os republicanos da Câmara se mostrou factível. Boehner precisava de apenas dois votos para a aprovação de sua proposta quando decidiu suspender a votação. Os dois votos republicanos não sairiam facilmente.

Mesmo aprovado, o projeto estava ameaçado de morte rápida, ao ser remetido ao Senado. "Assim que a Câmara completar sua votação nesta noite (ontem), o Senado vai se mover para matar essa proposta. Ela será derrotada", declarou o senador Harry Reid, líder da maioria democrata e autor de uma proposta alternativa com bênção da Casa Branca. "Nenhum democrata votará por um "band-aid" de curto prazo, que deixaria nossa economia em risco e colocaria a nação de novo nessa indefensável situação."

Reid referia-se ao aumento de apenas US$ 1 trilhão no teto da dívida, previsto no projeto de Boehner. O valor daria apenas para o governo aguentar até o fim deste ano, quando teria de voltar a negociar com o Congresso.

Na proposta de Reid, guardada para orientar prováveis negociações neste fim de semana, esse aumento seria de US$ 2,4 trilhões e daria tranquilidade para o presidente dos EUA, Barack Obama, atravessar 2012, ano de sua campanha para a reeleição.

Pressão. Durante todo o dia, a direita radical republicana, conhecida por Tea Party, pressionou Boehner a aumentar o valor do corte de gastos públicos - de US$ 850 bilhões, em sua proposta. Ele ofereceu US$ 900 bilhões e recebeu o apoio declarado de apenas 12 novos deputados republicanos, todos do baixo clero.

Trapalhadas complicaram o debate entre os republicanos. O senador John McCain, candidato à presidência em 2008, atacou o Tea Party por resistir a apoiar a proposta do presidente da Câmara. Valendo-se de crítica do Wall Street Journal à ingenuidade desses ultraconservadores, McCain os chamou de "hobbits", as criaturas fantasiosas do escritor J.R.R. Tolkien, autor de O Senhor dos Anéis.

"Prefiro ser um hobbit do que um troll", reagiu o enfurecido deputado Rand Paul, do Tea Party, em alusão também a outros personagens de Tolkien. "Acho que os hobbits são heróis. Ele enfrentaram grandes obstáculos."

Enquanto esperava pela batalha no Congresso, Barack Obama manteve-se recluso e silencioso. O porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, reiterou que a data-limite para a elevação do teto da dívida não será adiada. Sem indicar flexibilidade do governo, deixou claro que um compromisso razoável deverá incluir cortes de gastos e aumento de impostos, para os próximos dez anos, e uma elevação generosa do teto da dívida, para impedir nova ameaça de suspensão de pagamentos no fim deste ano.

Dan Pfeiffer, diretor de Comunicações da Casa Branca, chegou a invocar Papai Noel contra a proposta de Boehner. "O teto da dívida vai arruinar o Natal", afirmou à rede de tevê MSNBC.

Mercado. O mercado de ações fechou com os principais índices em direções divergentes, O Dow Jones caiu 0,51% e o S&P-500, 0,32%. Já o Nasdaq teve leve alta, de 0,05%. Os investidores estão ansiosos diante do impasse em torno do limite de endividamento americano. Muitos estão convencidos de que o país está em via de perder seu rating de crédito AAA, caso o Congresso não aprove uma elevação no teto da dívida e, a essa altura, até mesmo se o aumento for aprovado.