Título: Espero ardentemente queda dos juros no segundo semestre
Autor: Veríssimo, Renata ; Landim, Raquel
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/08/2011, Economia, p. B11

Um dos principais conselheiros da presidente Dilma, ministro afirma que ameaça inflacionária foi debelada e que não há razão para a maior taxa de juros do mundo

Depois de vencer sua primeira disputa política com o Ministério da Fazenda e dar corpo à política industrial anunciada na última terça-feira, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, quer ver uma redução da taxa de juros nos próximos meses. Pela primeira vez desde que assumiu a pasta, ele se mostrou à vontade para falar sobre temas econômicos.

Em entrevista ao Estado, o ministro avaliou que a ameaça inflacionária "está debelada", o que justifica "moderar, reduzir e até inverter" a tendência dos juros. "Espero ardentemente que, no segundo semestre, a Selic comece a cair", disse. Pimentel afirmou ainda que o real forte "veio para ficar", mas que a indústria não está preparada e o governo "não pode abrir mão" do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Amigo da presidente Dilma Rousseff desde os tempos de guerrilha, economista e um dos fundadores do PT, o ministro disse que nunca houve divergências "de fundo" com a Fazenda, mas admitiu a preocupação da equipe econômica com o impacto do Plano Brasil Maior. Argumentou, no entanto, que o crescimento da economia vai ajudar a engordar a arrecadação e compensar parte da renúncia fiscal.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Nos dias que antecederam o lançamento da política industrial, o Ministério do Desenvolvimento enfrentou dificuldades, mas convenceu a Fazenda a incluir a desoneração da folha de pagamento. Foi uma vitória política?

Não interpreto assim. Temos uma convergência grande entre os ministérios da área econômica. Mas é natural, ao montar um conjunto de medidas tão abrangente, ter dificuldade de chegar a um consenso. A Fazenda tem a obrigação constitucional de perseguir a meta de inflação e garantir o superávit primário. O Guido (Mantega, ministro da Fazenda) cumpre muito bem esse papel. Ele tem de ser mais cauteloso. Já eu e o Aloizio (Mercadante, ministro da Ciência e Tecnologia) temos de apresentar as propostas que chegam dos setores produtivos e que sempre estão querendo mais.

Como foi incluída a desoneração da folha de pagamento?

O Guido não era contra incluir a desoneração da folha. O que ele achava é que tínhamos de começar aos poucos. Não podemos fazer nada muito ousado, sob pena de colocar em risco uma proposta boa e necessária. Fizemos para quatro setores (têxteis, móveis, calçados e software), que são intensivos em trabalho.

O senhor já disse que a desoneração da folha não será ampliada este ano. É um compromisso para 2012?

Até o fim do ano não vamos incluir mais nada. Temos de monitorar o comportamento desse setores. E o espaço fiscal está ocupado este ano. Agora, no ano que vem, é outro orçamento. Quem sabe teremos uma folga para incluir mais algum setor? Mas não tem nenhuma meta específica. É o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), composto por representantes da sociedade civil e do governo, que vai dizer.

Até o fim do governo Dilma, haverá uma desoneração completa da folha, como prometido na campanha?

Se o CNDI aprovar isso como meta, acho que sim. Pessoalmente, acho que é possível perseguir essa meta, porque três anos e meio é tempo suficiente. Mas não depende da vontade política.

O governo pode ter dificuldades para fechar o Orçamento de 2012 com as novas desonerações?

Não vamos ter problema. A Fazenda foi muito cautelosa e fez todas as contas necessárias. E a expectativa é um crescimento de 4% a 4,5% do PIB no ano que vem, que garante expansão de arrecadação tributária suficiente para cobrir os incentivos e ainda obter as metas de superávit primário.

A política industrial também vai expandir o crédito, por meio de BNDES e Finep, enquanto o Banco Central tenta controlar a inflação. Isso foi considerado?

Sim. Esse dinheiro é colocado para o investimento de longo prazo. E não tem muita novidade. É o dinheiro que o BNDES estaria gastando mesmo. O repasse de R$ 55 bilhões que o Tesouro aprovou (para 2011) não vai mudar.

O BNDES vai precisar de mais repasses do Tesouro em 2012?

O BNDES é um instrumento fundamental da continuidade dos programas de investimento no Brasil. Não tem como abrir mão dele. Mas os repasses do Tesouro têm caído ano a ano. Em 2012, não sei quanto vai ser, mas será menos que em 2011.

Por que as empresas precisam de capital de giro do BNDES?

A pequena e média empresa manufatureira está sendo muito afetada pela competição internacional por causa do câmbio. Temos de dar capital de giro a juros mais baixos que os do mercado. Foi preciso subir os juros para conter a inflação. Acho que esse momento está superado. Espero ardentemente que, no segundo semestre, a taxa de juros básica, a Selic, comece a cair.

O senhor enxerga que há espaço para queda de juros no segundo semestre?

Eu não enxergo, quero enxergar. A ameaça inflacionária do fim do ano passado e do início deste ano está claramente debelada. Temos de ser cautelosos, mas não existe aquele risco tão alto como no começo do ano. Não sou do Copom (Comitê de Política Monetária). O Copom faz sua análise. Mas quero enxergar a possibilidade de começar a reduzir a taxa.

O BC prometeu colocar a inflação no centro da meta, de 4,5%, em 2012, mas o mercado duvida. O BC pode adiar a convergência para 2013?

Convergir para o centro da meta é um processo. Certamente significa dizer que a inflação esperada para o ano que vem será menor do que neste ano. E isso, por si só, já justifica moderarmos, reduzirmos ou até invertermos a tendência da taxa de juros. A inflação hoje está controlada, em 2012 estará declinante. Por que vamos manter a política monetária contracionista se temos uma inflação controlada e depois declinante? Não justifica. Temos de fortalecer nossa indústria.

Por que o senhor avalia que é importante cortar os juros? Por causa da atual crise internacional?

Não há nenhum motivo para termos a maior taxa de juros do mundo se nosso resultado fiscal é melhor, mas muito melhor, do que a média dos países desenvolvidos, que estão com juros baixos. Cortar os juros tiraria o capital especulativo e reduziria o custo Brasil. Reduzir o juro com cautela, no ritmo adequado, no médio prazo, é fundamental para estabelecer um patamar de câmbio que não vai ser R$ 3, mas também não precisa ser R$ 1,50.

O senhor já disse que o real forte veio para ficar.

A moeda brasileira valorizou-se por razões estruturais. Às vezes prestamos atenção nas questões conjunturais, como a taxa de juros. Mas não é só isso. Vamos continuar sendo muito atraentes para o capital do mundo inteiro. Temos recursos naturais abundantes. Não há risco de déficit na balança comercial. Tudo indica que o saldo vai ser muito maior que o do ano passado, mas não vou fazer previsão.

O governo vai reduzir o IPI das montadoras até 2016, mas o setor recebeu ajuda na crise e as vendas vão bem. Por que mais benefícios?

Agora é outro momento. O mercado está muito aquecido para os importados. Estamos perdendo market share em velocidade espantosa. Para um país que chegou a ser grande exportador de automóveis, virar importador não tem cabimento. Os veículos importados estão chegando aqui muito baratos. O setor automobilístico está sob ataque e temos de ajudá-lo. Agora, não vamos ajudá-los para ficarem parados. Vamos ajudar desde que comprovem que estão investindo em inovação.

Com a concorrência dos importadores, os preços dos automóveis caíram. Os carros custam caro no Brasil. Essa competição não é boa para o consumidor?

Mas agora o carro vai ficar barato com a redução de IPI.

As montadoras disseram que não vão repassar o IPI para o preço. O senhor espera um repasse?

Tem de ser repassado, senão, vão perder mercado. Não tenham dúvida que chineses e coreanos vão reagir a qualquer medida via preço. Se houver isso, vai ser uma guerra de preço positiva para o consumidor.

A Argentina continua demorando mais de 60 dias para liberar as licenças para produtos brasileiros. Os empresários reclamam que o governo é tolerante por causa das eleições presidenciais no país em outubro. O que está sendo feito?

Converso com a Débora Giorgi (ministra da Indústria) toda semana. É um pacto de convivência que temos com eles. Tem de negociar todo dia para liberar uma ou outra licença. Agora, por exemplo, há muita reclamação de nossos industriais da linha branca, que estão com volumes grandes de mercadorias parados na alfândega da Argentina. Já entrei em contato com os argentinos e pedi que liberassem. Temos de ter paciência. Países com fluxo de comércio muito intenso têm esse tipo de problema. Não entra nenhuma consideração de ordem eleitoral.

As exportações batem recorde por causa das commodities. A meta de exportar US$ 245 bilhões será revista para cima?

Vai ser. Vamos divulgar a projeção quando sair o resultado de agosto. Estamos com uma saúde muito boa na balança. Não há risco, nem para o ano que vem, de déficit. Mas precisamos melhorar a qualidade da pauta. Não podemos ter 80% da balança dependendo de quatro produtos.

Por que a criação do Eximbank ficou fora do Brasil Maior?

O problema do Eximbank foi só questão de tempo. Não queremos fazer tudo de uma vez só. Não seria prudente. Mas vai ser feito, está no radar para os próximos meses.