Título: Entidades agrícolas bancam campanhas
Autor: Bramatti, Daniel ; Duailibi, Julia
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/08/2011, Nacional, p. A8

Cooperativas que receberam verba da Conab fizeram em 2010 doações eleitorais para ex-ministro e para filho do atual titular da pasta

Cooperativas agrícolas que em 2010 receberam recursos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) financiaram campanhas de parlamentares com bom trânsito no Ministério da Agricultura, como o ex-ministro e deputado Reinhold Stephanes (PMDB) e o deputado estadual Baleia Rossi (PMDB), filho do atual titular da pasta, Wagner Rossi.

Desde 2009, a Lei Eleitoral proíbe que cooperativas "beneficiadas por recursos públicos" façam doações a campanhas eleitorais. Com base nesse dispositivo, especialistas ouvidos pelo Estado apontaram como irregulares as contribuições das entidades que fizeram negócios com a Conab. As cooperativas, no entanto, têm outra interpretação: alegam que a lei não é específica e que não são "beneficiadas" com recursos públicos, pois recebem a verba por causa de uma relação comercial - a venda de alimentos para a Conab.

Levantamento feito pelo Estado nas unidades da Conab que mais movimentaram recursos em 2010 - São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais - detectou pagamentos a 17 cooperativas agrícolas que financiaram candidatos. A pesquisa se restringiu às entidades que receberam pelo menos R$ 300 mil do governo federal no ano passado.

Valores. "Se uma empresa pode financiar uma campanha eleitoral, isso significa que terá representatividade no Congresso. É assim que funciona. Se as cooperativas não puderem participar (das doações), ficarão sem representação", afirmou o deputado Paulo Piau (PMDB-MG), vice-presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop).

"Não há dúvida de que essas doações não poderiam ter sido feitas", disse Alberto Luís Rollo, especialista em direito eleitoral. "Mas o prazo já passou para eventuais impugnações de candidatos." O advogado Tito Costa, que também atua na área, interpreta a lei da mesma forma: "Cooperativas que recebem recursos públicos não podem doar para candidatos".

Na eleição de 2010, as cooperativas contabilizadas pelo Estado contribuíram aos candidatos com R$ 1 para cada R$ 95 recebidos do governo. Ao todo, as entidades doaram mais de R$ 1,8 milhão para parlamentares e receberam R$ 179 milhões do Ministério da Agricultura como forma de pagamento pela compra de alimentos via Conab.

Até 2009, a lei proibia qualquer tipo de doação por parte das cooperativas. Uma mobilização dos ruralistas no Congresso levou à mudança na regra - ficaram impedidas de doar apenas as entidades "concessionárias ou permissionárias de serviços públicos" ou "beneficiadas com recursos públicos".

Para o presidente da Frencoop, senador Waldemir Moka (PMDB-MS), a discussão sobre as vedações na lei são de ordem "jurídica, não política". "Não havendo impedimento, não há nenhum problema nas cooperativas influenciarem a eleição por meio dos seus representantes."

A Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec) recebeu da Conab R$ 24 milhões no ano passado. A entidade participou da campanha eleitoral de 2010 doando cerca de R$ 250 mil para sete candidatos a deputado, entre os quais Baleia Rossi, filho de Wagner Rossi - que assumiu o Ministério da Agricultura em abril daquele ano. Ele recebeu R$ 33 mil.

Reinhold Stephanes, que comandou o Ministério da Agricultura entre 2007 e 2010, quando se desincompatibilizou para disputar a eleição, recebeu R$ 90 mil de três entidades: Cooperativa Agropecuária Castrolândia, Cooperativa Agrícola Mista São Cristovam e Capal - Cooperativa Agroindustrial. Ao todo, elas receberam R$ 16 milhões do ministério no ano passado.

Além de peemedebistas, cooperativas também beneficiaram candidatos de outras legendas. A Cooperativa Agroindustrial (Cocamar), que recebeu R$ 849 mil da Conab em 2010, fez doações de R$ 40 mil à campanha para o Senado da atual ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann (PT), e de R$ 50 mil a Beto Richa (PSDB), candidato ao governo do Paraná.

Durante a campanha de 2010, as cooperativas se organizaram para aumentar a bancada de apoio no Congresso, hoje formada por 224 deputados e 26 senadores. Foram realizados seminários para apresentar os candidatos que contavam com o apoio do segmento.