Título: Regras eficientes, energia competitiva
Autor: Pedrosa, Paulo
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/08/2011, Economia, p. B2

Os avanços do setor elétrico brasileiro nos últimos anos incluem o fortalecimento do planejamento setorial, um modelo que garante a expansão da geração e a qualificação das equipes técnicas dos órgãos governamentais. Mas, apesar de tudo isso, os consumidores brasileiros pagam uma das contas de energia mais caras do mundo. Parte desse problema se deve a políticas que foram congeladas em leis e regulamentos, incorporando incentivos e subsídios às contas de energia.

A reversão dessa tendência passa pela adoção de mecanismos de Análise de Impacto Regulatório (AIR), um instrumento defendido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que recomenda um check list com questões como: Que problema se pretende resolver? Há alternativas de solução? Os benefícios justificam os custos? Como se distribuem? As regras são claras e coerentes? Os interessados foram ouvidos? Que mecanismos de promoção de eficiência, avaliação e aperfeiçoamento estão incorporados às regras?

Se usado periodicamente, esse teste de consistência eliminaria distorções que encarecem a energia no Brasil e têm merecido o interesse de equipes do Ministério de Minas e Energia e da Agência Nacional de Energia Elétrica, que muito podem contribuir para a melhoria de políticas do passado. A metodologia é válida tanto para questões simples e corriqueiras da regulação como para solucionar problemas complexos, como o das concessões.

Um exemplo é a política criada para promover as pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que pode estar prejudicando seu desenvolvimento na forma mais eficiente para o País. A lógica de viabilização das PCHs combina a agilidade de seu processo de construção com o acesso a um mercado de consumidores livres especiais, apoiado por desconto nas tarifas de transporte da energia. Essa política estimula que tais usinas sejam contratadas por consumidores de médio porte, como supermercados e pequenas indústrias, principalmente aqueles atendidos por distribuidoras com tarifas elevadas (nas quais o desconto legal é mais atrativo). O processo tende a onerar mais os consumidores que permanecem atendidos pela distribuidora, alimentando novas saídas de consumidores de médio porte das mesmas concessões. Além do mais, afasta da energia incentivada os consumidores de alta-tensão, para os quais o desconto no transporte é insuficiente para tornar a compra competitiva.

Além de segmentar o mercado e torná-lo mais complexo e menos líquido, esse encaminhamento dificulta o acesso às usinas pelas indústrias, que têm apetite por contratos de energia de longo prazo e podem oferecer aos empreendedores garantias consistentes para os financiamentos necessários.

É importante refletir sobre alternativas que possam dar maior transparência a esse processo, distribuir melhor seus custos e dosar adequadamente o incentivo ao mínimo necessário para viabilizar os empreendimentos. Também é fundamental que se permita uma irrigação do mercado livre com energia dessas usinas. Isso seria providencial, tendo em vista que ele não tem tido acesso à energia nova dos leilões em condições competitivas.

A mesma ferramenta de AIR pode ser útil para melhorar a eficiência de outras políticas públicas atribuídas aos consumidores de energia, sem negar o mérito de cada uma delas. A avaliação se aplicaria ao subsídio dos consumidores de baixa renda, expansão das redes de eletrificação rural, subsídio da geração térmica nos sistemas isolados, promoção do desenvolvimento tecnológico setorial, custeio da regulação, fiscalização, planejamento e operação do sistema e promoção do desenvolvimento das fontes alternativas de energia. Certamente, teríamos muito a ganhar expondo a essa análise encargos, subsídios, taxas e mecanismos compensatórios e de arrecadação que hoje pesam sobre os preços e as tarifas de energia, comprometendo a competitividade da produção nacional.

PRESIDENTE EXECUTIVO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GRANDES CONSUMIDORES INDUSTRIAIS DE ENERGIA E DE CONSUMIDORES LIVRES (ABRACE)