Título: Embaixador líbio no Brasil abandona Kadafi
Autor: Sant?Anna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/08/2011, Internacional, p. A14

Antes favorável ao ditador, Salem el-Zubeide diz ter concluído que o povo líbio está ao lado da oposição e declara lealdade ao conselho de transição

Provavelmente o último defensor do ditador Muamar Kadafi no Brasil, o embaixador da Líbia Salem el-Zubeide entregou os pontos e declarou ontem sua lealdade ao Conselho Nacional de Transição (CNT). Depois de uma semana de resistência, o diplomata chamou a imprensa para dizer que finalmente havia concluído que a população líbia está ao lado do CNT e ele vai "servir aos interesses do povo".

Isolado, o embaixador leu uma declaração, respondeu algumas perguntas e logo depois deixou o prédio sozinho, dirigindo seu automóvel. Sem clima para continuar despachando na embaixada, voltou para a residência oficial, onde tem permanecido desde segunda-feira.

"Depois de várias semanas estudando a situação no meu país, em consulta com colegas ao redor do mundo, cheguei à conclusão de que o povo líbio está ao lado do Conselho Nacional de Transição. Portanto, quero declarar minha lealdade ao conselho, continuando a trabalhar como embaixador líbio no Brasil, servindo aos interesses do povo líbio, à disposição do CNT, até que alguém seja designado para desempenhar esse papel", disse.

Visivelmente abatido, um tanto constrangido e com dificuldades de falar português, o embaixador não teve a ajuda de um tradutor, como em outras conversas com a imprensa - mais um sinal de seu isolamento entre os próprios conterrâneos. Apenas um diplomata líbio estava na sala, mas como espectador.

Zubeide perdeu o controle da embaixada no mesmo dia em que os rebeldes invadiram Trípoli. Há uma semana, diplomatas contrários a Kadafi e outros líbios que moram no Brasil tomaram o prédio, retiraram a bandeira verde que representava a ditadura e as placas que identificam o local como "Grande Jamairia Socialista Árabe do Povo Líbio", nome oficial da Líbia sob o regime do ditador. Na segunda-feira, o embaixador chegou a ir até a representação, mas foi embora depois de ser confrontado pelos demais diplomatas, que hastearam a bandeira rebelde.

Em conversas com representantes do Itamaraty, Zubeide recebeu a garantia de que ainda era considerado o embaixador da Líbia até que chegasse ao Brasil uma nova indicação. Nos últimos dias, ficou na residência oficial, onde ainda tremulava a bandeira verde de Kadafi. No início da tarde de ontem, depois da sua declaração de apoio ao CNT, a bandeira já havia sido retirada.

"Até que outro embaixador seja designado, eu sou o embaixador", garantiu Zubeide. "Como eu disse na minha conferência de imprensa, quando a primavera árabe chegou às praias de Benghazi, eu fui escolhido pelo povo árabe através dos mecanismos do governo líbio para representá-lo no Brasil." Mesmo assim, suas declarações foram recebidas com ceticismo pelos outros funcionários da embaixada. Nenhum dos diplomatas líbios presentes aposta que Zubeide durará muito tempo no Brasil.