Título: No pós-mensalão, PT estuda inchar quadro de filiados e aumentar dízimo
Autor: Rosa, Vera
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/08/2011, Nacional, p. A4

Sigla abre seu 4º Congresso esta semana com discussão sobre finanças, combalidas após o principal escândalo da Era Lula, mas propostas dividem dirigentes que pregam desde o incremento radical do número de militantes à cobrança linear de mensalidade

Seis anos depois do escândalo do mensalão, período de campanhas milionárias e suntuosos encontros partidários, o PT ainda tenta encontrar um modelo de sustentação financeira. Discussões sobre inchaço do número de filiados e aumento do tradicional "dízimo", hoje cobrado com rigor apenas dos militantes com cargos na máquina pública, estão na lista das principais polêmicas do 4.º Congresso do PT, que começa na sexta-feira e vai até domingo, em Brasília.

Até agora, propostas que pregam o endurecimento das normas estabelecidas para filiação e regras mais rígidas para disputa em prévias racharam o PT. As maiores divergências estão na corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), a mesma do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, majoritária na legenda.

Convocado para reformar o estatuto do partido, o encontro vai discutir de tudo um pouco: desde propostas que representam uma guinada à esquerda e remetem aos anos 80 - quando o interessado em ingressar na legenda passava por um "batismo" - até aquelas que abrem as portas do petismo para adesões em massa.

A presidente Dilma Rousseff e Lula estarão juntos na abertura do congresso, na sexta-feira à noite. A direção do PT espera fazer do encontro um "happening" e rasgará elogios ao governo Dilma na resolução política a ser aprovada no sábado. Nos bastidores, porém, há uma disputa pela concepção que deve nortear o partido quase nove anos após chegar ao Planalto.

Sob a coordenação do deputado Ricardo Berzoini (SP), ex-presidente do PT, o anteprojeto de reforma do estatuto propõe uma taxa semestral de contribuição para filiados que não ocupam cargo eletivo nem cadeiras no Executivo. Hoje, esses filiados devem pagar o dízimo anualmente, mas, na prática, os desembolsos só são feitos às vésperas de prévias ou eleições diretas para a escolha do presidente do partido, os chamados PEDs.

Desde 2002, quando Lula chegou ao Planalto, até hoje, o número de filiados do PT saltou de 828 mil para 1,45 milhão, um aumento de 75%. Mesmo assim, o partido continua no vermelho. Apesar de ter renegociado sua dívida após o mensalão (2005), o rombo chega aos R$ 35 milhões.

O secretário de Organização do PT, Paulo Frateschi, defende uma "contribuição simbólica" para os filiados. Na sua opinião, apenas ocupantes de cargos eletivos e de confiança no Legislativo ou Executivo, além dos dirigentes partidários, devem pagar mensalidade. O dízimo para o alto escalão, hoje, varia de 2% a 20% do salário líquido.

Abertura. "Se o Brasil mudou, o PT tem que mudar. Por que tantas restrições para a filiação? Queremos abrir o partido, e não burocratizá-lo", disse Frateschi.

Integrante da CNB, a mesma corrente de Frateschi, Berzoini discorda da avaliação. Para o deputado, o atual modelo só incentiva o preenchimento de fichas, sem qualquer compromisso ideológico, e mantém o PT refém do poder econômico.

"Nós também queremos um partido de massa, mas não de massa de manobra", afirmou Berzoini. "Precisamos cultivar uma política de independência financeira, até porque pregamos o financiamento público de campanhas, e não o sustentado por contribuição de empresas."

Em conversas reservadas, até mesmo dirigentes admitem que muitas filiações, desde que o partido chegou ao poder, foram obtidas na última hora, nos embates entre as correntes do petismo.

Nos últimos anos, a cúpula do PT recebeu inúmeras denúncias de que, para conseguir apoio à sua chapa ou mesmo ao seu candidato nas prévias, tendências transportavam filiados aos locais de votação e pagavam contribuições atrasadas com o valor mínimo, de R$ 15.

Na tentativa de evitar a prática comum em currais eleitorais, a comissão coordenada por Berzoini, e também integrada por Frateschi, quer que filiados sejam obrigados a quitar o dízimo três meses antes das eleições internas. O ex-presidente do PT propõe, ainda, que os calouros conheçam o programa do partido em uma "plenária de formação" e só possam votar e ser votados após dois anos na legenda.

Maçonaria e Prévia. "Desse jeito, é mais fácil entrar na maçonaria do que se filiar ao PT", ironizou o deputado Jilmar Tatto (SP), um dos pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo.

Outra proposta que divide o PT dificulta a realização de prévias para a escolha dos concorrentes a prefeito, governador e presidente, como antecipou o Estado. Uma das emendas apresentadas diz, por exemplo, que 2/3 dos integrantes do diretório podem decidir não convocar prévias, empurrando a tarefa para o encontro de delegados.

No momento em que Lula abençoa a candidatura de Fernando Haddad em São Paulo, outros pré-candidatos definiram a tentativa de mudança como casuísmo. "Não necessariamente as novas regras devem valer para 2012", avisou Berzoini. "Só queremos evitar disputas artificiais, nas quais interesses individuais se sobrepõem aos coletivos."