Título: BB terá de cancelar consignados com exclusividade
Autor: Froufe, Célia
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/09/2011, Economia, p. B10

Para o Cade, cláusula de exclusividade na concessão de crédito a funcionários públicos pode configurar abuso de poder econômico O Banco do Brasil terá de suspender imediatamente todos os contratos que detém com cláusulas de exclusividade na concessão de crédito com desconto em folha de pagamento de servidores públicos. A determinação partiu do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que ainda decidiu abrir uma investigação contra a instituição para apurar possível "abuso de poder econômico".

Para justificar a decisão inédita, o presidente do Cade, Fernando Furlan, atacou o Banco Central, responsável pelo monitoramento do sistema financeiro. "Se o Banco Central estivesse atuando, menores seriam nossas preocupações", afirmou Furlan. "O Banco Central se furta de atuar e deixa o mercado descoberto."

Se a direção do Banco do Brasil não acatar a determinação de suspender imediatamente os contratos com cláusula de exclusividade em vigor, a instituição terá de pagar multa diária de R$ 1 milhão. "Isso representa dois milionésimos por cento do total do mercado de crédito consignado do Banco do Brasil", calculou o relator do caso, Marcos Veríssimo.

Essa suspensão terá de ser informada pelo próprio BB aos servidores, que poderão quitar os contratos em operação e até mudar de banco. Em 20 dias, o BB terá de enviar ao Cade cópias dos contratos feitos a partir de 2006, quando, suspeita-se, a prática começou.

Juros altos. Entre os itens a serem investigados, o Cade quer saber se o BB se aproveitou da exclusividade para cobrar dos funcionários públicos juros mais altos que os praticados pela concorrência. A preocupação existe, segundo Veríssimo, porque o mercado de consignado compreende ativos no valor de R$ 139,7 bilhões. Apenas o Banco do Brasil trabalha com um terço desse total, um volume de R$ 47,9 bilhões, dos quais 80% são dirigidos aos servidores.

"O funcionário de uma prefeitura, por exemplo, só tem hoje uma opção de crédito consignado, e quem tem isso pode cobrar juros mais altos do que a concorrência", argumentou o conselheiro.

A entidade representativa de servidores municipais e estaduais de 12 Estados, a Fesempre, comemorou a decisão do Cade. Há mais de um ano, advogados da federação buscam o fim dessa exclusividade. "O Cade fez história no controle do abuso do poder econômico, em defesa do estado democrático de direito", afirmou o advogado Vicente Bagnoli.

Competência. O gerente executivo da área jurídica do Banco do Brasil, Nivaldo Pellizzer, disse, no entanto, que não reconhece a competência do Cade para fazer a investigação. Além disso prometeu que, após ser intimado, o banco tomará as "providências cabíveis" no Judiciário. Isso porque, na avaliação da Advocacia Geral da União (AGU), o único órgão público competente para tomar decisões relativas ao sistema financeiro é o Banco Central.

De acordo com Veríssimo, no entanto, o próprio Banco do Brasil já encaminhou casos para o Cade recentemente. Além disso, conforme o relator, o Banco Central disse que não possui legislação para atuar na questão da defesa da concorrência. Em janeiro, a autoridade monetária proibiu que as instituições restringissem ou impedissem o acesso de clientes a operações de crédito oferecidas por concorrentes.

A determinação do BC, porém, vale apenas a partir daquela data e não para os contratos que já estavam em vigor. O Banco Central, de acordo com sua assessoria de imprensa, não tinha como comentar o assunto ontem porque seus diretores estavam participando da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que também acabou surpreendendo, ao definir um corte de 0,50 ponto porcentual na taxa básica de juros, a Selic.

Alerta

FERNANDO FURLAN PRESIDENTE DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA (CADE)

"Se o Banco Central estivesse atuando, menores seriam nossas preocupações."

"O BC se furta de atuar e deixa o mercado descoberto."