Título: Governo teme recessão no fim do ano
Autor: Dantas, Iuri ; Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/09/2011, Economia, p. B4

Fontes do governo dizem que BC cortou juro ao projetar PIB negativo nos 3º e 4º trimestres, o que dificulta crescimento de 5% em 2012

O governo tinha indicações que as variações do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no terceiro e no quarto trimestres deste ano poderiam vir negativas, evidenciando um "mergulho" da atividade econômica. Integrantes da área econômica acreditam que isso pode ter precipitado a ação do Banco Central, que decidiu cortar a taxa de juros em 0,5 ponto porcentual, para 12% ao ano, surpreendendo o mercado financeiro.

O corte nos juros foi feito esta semana para evitar que na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em outubro, a redução necessária fosse ainda mais drástica. As evidências de esfriamento interno e externo são tão contundentes que o Banco Central já se prepara para cortar de 4% para 3,5% a taxa de expansão do PIB em 2011 no Relatório de Inflação que será divulgado no fim deste mês. O número pode ser modificado, a depender dos dados econômicos que serão divulgados ao longo dos próximos 20 dias.

Com a redução da estimativa, o BC tenta transmitir a mensagem de que não trabalha com meta de crescimento do PIB. Ou seja, havia espaço para corte nos juros porque a economia cresceria menos, colocando menor pressão sobre a inflação.

Por enquanto, o Ministério da Fazenda mantém sua projeção de 4,5% de crescimento, mas o ministro Guido Mantega admitiu que o resultado deve ser mais próximo de 4%. A divulgação do resultado do PIB do segundo trimestre na sexta-feira, mostrando desaceleração, confirmou o que a área econômica já sabia. Os técnicos esperavam crescimento entre 0,5% e 1%. O resultado divulgado pelo IBGE foi uma expansão de 0,8% sobre o trimestre anterior, o que aponta para uma taxa anualizada de 3,2%.

Crescimento de 5%. Esse dado preocupa, porque a prioridade do governo é garantir que a economia tenha uma expansão entre 4% e 5% no ano que vem, a despeito das dificuldades enfrentadas por Estados Unidos e União Europeia. Tanto é assim que Mantega admitiu, na sexta-feira, que poderão ser utilizados novamente estímulos fiscais à economia em 2012, caso a desaceleração seja muito forte. Por enquanto, porém, a opção é por cortar juros em vez de reduzir impostos e gastar mais. É o que Mantega chamou de "novo mix" da política econômica.

Mercado. A ordem é preservar o mercado doméstico aquecido, até em resposta à crise externa. O aumento das faixas do Supersimples, instrumento que permite menor pagamento de impostos por empresas, e a redução nas taxas de juros do microcrédito vão nesta linha. Mas os técnicos reconhecem que a desaceleração nos países avançados pode ser uma dificuldade, mesmo para economias pouco dependentes do comércio exterior como é a do Brasil. O peso das exportações no PIB é da ordem de 13%.

Um dos quadros usados para reforçar os argumentos do BC para cortar os juros, por exemplo, é a China. Lá, a economia dá sinais mais frequentes de desaceleração. Nesta quinta, por exemplo, foi divulgado que o índice que mede a intenção de compra nas empresas oscilou ligeiramente em agosto e segue próximo do pior nível em 29 meses.

Como a China é um dos maiores compradores do Brasil, pode haver risco de queda no preço das mercadorias exportadas pelo Brasil. O comunicado divulgado pelo Copom dizia que um dos primeiros canais de transmissão da crise externa para o Brasil será o comércio exterior.

Em sua estratégia de evitar uma queda na atividade econômica, o governo será ajudado em 2012 pelo aumento de pelo menos 13,6% do salário mínimo. Só por conta de aposentadorias e benefícios assistenciais do governo federal, esse reajuste injetará R$ 21,5 bilhões na economia. O aumento do salário mínimo em 2009 foi apontado como um dos principais fatores que protegeu a economia brasileira contra os efeitos da crise. Também os salários do setor privado serão de ajuda ao governo, pois há reajustes acima da inflação, como é o caso dos 10% concedidos aos metalúrgicos do ABC.

O aumento da renda dos assalariados é apontado por economistas de fora do governo como um elemento que torna a atividade econômica do Brasil diferente da do exterior. Há quem duvide que o efeito "desinflacionário" da crise, apontada pelo Banco Central como explicação ao corte dos juros, tenha a magnitude esperada pela autoridade monetária. Economistas do governo consideram, porém, que uma taxa de crescimento de 5% não gerará pressões sobre a inflação.