Título: Dólar dispara e se aproxima de R$ 1,80
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/09/2011, Economia, p. B1

As tensões decorrentes da crise europeia chegaram com força ao mercado de câmbio. O dólar iniciou a semana com alta de 2,54%, valendo R$ 1,774, cotação mais alta desde 21 de julho de 2010. Nos últimos 30 dias, o real apresenta a maior queda ante o dólar no ranking com as 16 principais moedas do mundo. Algo que, segundo analistas, indica que atitudes recentes do governo brasileiro também têm influenciado o humor dos investidores.

Esse levantamento revela que as perdas da moeda brasileira já alcançam 11,01% no período, ante 11% do franco suíço. Vale lembrar que o governo da Suíça adotou recentemente um piso para sua moeda, o que explica grande parte da desvalorização. A seguir, com 6,23% de perdas, vem o peso mexicano e, com 6,05%, o rand da África do Sul.

Uma prova de que a crise global novamente tem levado a um movimento de busca por segurança é que apenas o dólar da Nova Zelândia acumula valorização ante seu par dos Estados Unidos - mesmo assim, de 0,68% nos últimos 30 dias. Em geral, situações como a atual provocam um movimento conhecido como fuga para a qualidade (ou flight to quality, na expressão em inglês).

Em relação ao real, explica o economista-chefe da Sul América Investimentos, Newton Rosa, há ao menos duas razões adicionais para explicar a queda recente. A primeira delas foi a inesperada redução da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central (BC) no fim de agosto e a certeza de que novas baixas virão.

"Isso diminui o diferencial entre o juro brasileiro e o do resto do mundo", afirmou. "Assim, cai também o apetite pelo carry-trade." Rosa refere-se a um tipo de operação comum no mercado global, em que investidores tomam dinheiro emprestado em países com juro baixo e o aplicam em países com taxa elevada. Como o Brasil ostenta, há muito tempo, o título de campeão mundial do juro alto, naturalmente atrai recursos por esse canal.

A outra razão diz respeito às próprias medidas do governo Dilma Rousseff para enfraquecer o real e, por tabela, favorecer as exportações. Um exemplo prático é a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para compras com cartão de crédito no exterior.

"Esse intervencionismo do governo Dilma no câmbio tem levado muitos investidores a mudar de posição (ou seja, a apostar na valorização do dólar ante o real)", disse Rosa. "É por isso que o real tem se desvalorizado tanto nas últimas semanas", afirmou outro analista que pediu para não ser identificado.

Especificamente ontem, pesou no mercado a desconfiança sobre as negociações da Grécia com a chamada troica (Comissão Europeia, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu) para a concessão da segunda parcela de empréstimo para o país honrar suas dívidas.

Perto do fim dos negócios no mercado cambial (horário brasileiro), surgiu a informação de que um acordo entre a Grécia e seus credores estaria mais próximo, o que acalmou um pouco os investidores. A alta do dólar desacelerou de mais de 3% para os 2,54% do fechamento.

Hoje, porém, espera-se mais nervosismo. No início da noite de ontem (hora de Brasília), quando o mercado cambial já estava fechado, a agência de classificação de risco Standard & Poor¿s rebaixou o rating (nota) da Itália de A+ para A.

No curto prazo, ninguém afirma categoricamente qual a tendência para o dólar no Brasil. A única certeza é que haverá muita volatilidade. No médio e longo prazos, porém, especialistas como o diretor executivo da NGO Corretora de câmbio, Sidnei Nehme, acreditam que os fatores estruturais vão prevalecer. Em outras palavras, o real deve voltar a se fortalecer.