Título: Oposição a Assad se arma e crise ganha cores de guerra civil em cidade da Síria
Autor: Shadid, Anthony
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2011, Internacional, p. A10

Uma aparente guerra civil vem sendo travada em Homs, terceira maior cidade da Síria, onde manifestantes da oposição se armaram e agora se autodenominam "revolucionários". Confrontos armados ocorrem quase toda hora, forças de segurança e oponentes cometem assassinatos e fuzis que custam US$ 2 mil chegam em enormes quantidades, vindos do exterior, segundo os moradores.

Desde o início da rebelião em março, Homs tem sido uma das cidades mais combativas da Síria e seus jovens os mais bem organizados e obstinados. Mas em todo o espectro político, os moradores falam de uma mudança decisiva nas últimas semanas, uma vez que as revoltas pacíficas deram lugar a tiroteios pesados que tornaram a cidade violenta, temida e determinada.

Para analistas, os conflitos ainda são específicos da própria cidade e muitas pessoas que estão na oposição rejeitam a violência pois temem que ela servirá de pretexto para uma repressão brutal por parte do governo.

Com assassinatos premeditados, instalação de postos de controle e intensificação dos sentimentos sectários, a cidade oferece uma sombria visão do que poderá ser o futuro das revoltas no país na medida em que governo e oposição estão dispostos a uma luta prolongada envolvendo a persistência de uma ditadura de quatro décadas.

"Acabou a fase do protesto", disse um estudante de engenharia de 21 anos, que não quis se identificar. "Entramos agora numa etapa mais importante."

Homs é um microcosmo da Síria, com uma maioria muçulmana sunita e minorias de cristãos e alauitas, uma seita muçulmana heterodoxa com a qual o presidente Bashar Assad conta para manter sua liderança. Seis meses de protestos e repressão desgastaram as boas relações entre as comunidades, criando as condições para a guerra urbana.

Uma oposição armada vem combatendo as forças de segurança nos bairros mais rebeldes. A tensão é tamanha que membros de uma seita relutam em viajar para áreas povoadas por outras seitas.

Em algumas áreas da cidade, os homens carregam armas abertamente.

Uma das facetas mais dramáticas dessa é série de assassinatos registrados na semana passada, com a morte de quase uma dezena de professores, médicos e informantes, mortos numa onda de violência que lembra as vendetas sectárias que ainda afligem o Iraque.

Ao contrário dos primeiros dias da rebelião, quando o governo tinha praticamente o monopólio sobre a violência, o medo agora começa a se estender para outra direção, com insurgentes matando partidários do governo e informantes, dizem os moradores.

Uma das pessoas mortas foi o Hassan Eid, chefe do departamento de cirurgia torácica do Hospital Nacional, em Homs, e alauita de Al-Zuhra, um dos distritos onde a seita é majoritária e prédios e ruas ainda estão repletos de retratos de Assad. Ele foi morto a tiros na frente da sua casa, quando saía para o trabalho.

O Al Ouruba, jornal alinhado com o governo, qualificou o médico como um "símbolo da dedicação" afirmando que ele cuidada das vítimas da violência "sem fazer discriminação entre elas". Mas para os sunitas locais, ele era informante do governo e ajudava as forças de segurança a deter os feridos que estavam sendo tratados no seu hospital. Algumas pessoas comemoraram seu assassinato.

"Ele foi responsável pela morte de muitos jovens", disse um morador de 65 anos, que disse chamar-se Rajab. "Ele foi morto porque mereceu".