Título: Brasil deve manter posição neutra sobre Síria em novo debate na ONU
Autor: Chade, Jamil ; Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2011, Internacional, p. A15

Cautela. Um dia depois de a ONU confirmar 2,9 mil mortes desde o início dos protestos contra regime sírio, Itamaraty deve conservar sua estratégia de evitar condenação a Damasco, sob o argumento de que queda de Assad levaria mais instabilidade à região

O Brasil adotará uma posição "neutra" na sabatina que a ONU realizará hoje sobre a situação dos direitos humanos na Síria. O governo de Bashar Assad será avaliado pela entidade, em Genebra, um dia depois de as Nações Unidas confirmarem a existência de 2,9 mil mortos desde o início dos protestos contra o governo.

Governos europeus e o dos EUA estão preparados para lançar duras críticas contra Assad e sua repressão. No caso brasileiro, a ordem da cúpula do Itamaraty é que a posição do País seja a mais neutra possível em sua intervenção e propostas à Damasco. O Brasil não quer politizar o debate dos direitos humanos e também rejeita usar a questão para eventualmente justificar uma intervenção armada no país, como ocorreu na Líbia.

Além disso, ao adotar ao adotar tal posição, o Brasil manteria os canais abertos com Assad. Ao Estado, o assessor do Palácio do Planalto para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, declarou há dois dias que estava satisfeito com o veto de Rússia e China à uma proposta de resolução no Conselho de Segurança, na terça-feira, que condenava a Síria. Na avaliação do governo, um desmoronamento do governo pode significar uma desestabilização ainda maior de toda a região.

Na Bulgária, onde acompanhava a presidente Dilma Rousseff, o chanceler Antonio Patriota fugiu como pode de perguntas sobre a Síria. Questionado pelo Estado se trataria com os turcos sobre Damasco, Patriota desconversou. "Vamos falar das relações entre a Turquia e Brasil", disse.

A questão síria deve justamente marcar a principal divergência entre as diplomacias de Brasil e Turquia - que se encontram a partir de hoje, em Ancara e Istambul. Aliados em questões centrais, como o programa nuclear do Irã, os dois países estão em campos opostos sobre Assad. Embora elogie o esforço político turco, que apoia os movimentos de oposição da região, o Brasil continua defendendo uma posição contrária às mudanças de regime da primavera árabe.

Dilma vai se encontrar hoje com o presidente da Turquia, Abdullah Gul, e amanhã com o primeiro-ministro, Tayyip Erdogan, em sua passagem por Istambul. Segundo Marco Aurélio Garcia, o Brasil vai ouvir os argumentos da diplomacia turca, que tem assumido posição de exemplo para a região ao conciliar democracia com o islamismo. "Vamos conversar. Queremos ouvir posições da Turquia, porque ela está mais próxima", afirmou o assessor, que não quis entrar em detalhes sobre se os argumentos turcos podem ajudar o Brasil a mudar sua posição.

Segundo Garcia, os próximos passos da diplomacia brasileira na região estão sendo "calculados" com calma, porque a situação é avaliada como "muito complexa". "Temos de ver como uma mudança política na Síria, com o Assad ou sem o Assad, o que é uma coisa que vai ser decidida, vai incidir em complexos problemas da região, que são Líbano, Palestina e Irã."