Título: Super Cade terá mais poderes que a PF
Autor: Froufe, Célia
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2011, Economia, p. B8

Funcionários do órgão, que investiga cartéis, poderão entrar nas empresas a qualquer momento, sem autorização judicial, para buscar provas

Com a ajuda do DEM, o Super Cade, cuja criação foi aprovada anteontem à noite pelo Congresso Nacional, ganhou superpoderes para investigar cartéis e outras práticas desleais de concorrência. Os funcionários do órgão poderão entrar nas empresas a qualquer momento, sem autorização judicial, para buscar provas. Isso é mais poder investigativo do que dispõe a Polícia Federal.

O governo nem contava com isso. A proposta era apenas manter a situação como é hoje: podem ser feitas inspeções nas empresas, desde que notificadas com 24 horas de antecedência. Mas, minutos antes da votação, numa tumultuada reunião do governo com líderes partidários, o DEM insistiu em retirar a necessidade da notificação com antecedência de 24 horas.

"Não faz sentido avisar antes, porque perde o efeito surpresa", justificou o líder do partido, Antônio Carlos Magalhães Neto (BA). Ele não considera que o Cade terá poderes exagerados.

A inspeção é um instrumento que só foi utilizado uma vez pelo Cade, de acordo com o secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Vinícius Carvalho. Mas seu uso se mostrou eficiente. Numa visita à Ambev, foram coletadas provas que permitiram ao colegiado aplicar a maior multa de sua história - R$ 352 milhões - pela prática de exclusividade nos pontos de venda.

Uma vez aprovada a nova lei, o grande desafio do governo agora é estruturar o Super Cade. "Se não contratarem mais especialistas, eles vão se meter num barral imenso", alertou o ex-presidente do Conselho Rui Coutinho.

Em seis meses, tudo tem de estar pronto para que entre em vigor a principal mudança da lei: as fusões entre empresas terão de ser analisadas antes de ocorrerem, e não depois, como é hoje. "Do ponto de vista das empresas, isso vai mudar a postura nas negociações dos contratos", avaliou Lauro Celidônio, do escritório Mattos Filho Advogados.

Hoje, duas empresas se fundem e têm prazo de 15 dias para notificar o Cade. Com a nova lei, elas terão de obter autorização do Cade antes de fechar o negócio. Isso vai exigir que os contratos sejam mais detalhados para prever como proceder enquanto o Cade não dá o sinal verde para o negócio, ou quem vai arcar com o risco de uma eventual rejeição, explicou Celidônio.

Além disso, o órgão antitruste não aceitará mais apresentação de novos negócios com dados imprecisos ou incompletos, como ocorre atualmente.

Veredito. Hoje não há pressa, pois a contagem do prazo de 60 dias para o Cade dar seu veredito era suspensa cada vez que se solicitavam novos dados. Agora, o prazo máximo é de 330 dias, mas ele correrá sem parar.

"Certamente, as empresas precisarão se planejar muito mais", observou o economista César Mattos, ex-conselheiro do Cade. Ele acrescentou que muitas empresas não têm pressa na decisão do Cade, pois a fusão pode entrar em funcionamento enquanto corre o processo. Com a nova lei, elas não poderão fazer nada antes da aprovação, por isso terão interesse numa decisão rápida.

Hoje, o Conselho pode congelar processos de fusão que considere potencialmente perigosos para a concorrência.

O Acordo de Preservação da Reversibilidade da Operação (Apro) é usado para garantir que um negócio não seja finalizado, de fato, até o julgamento final do órgão antitruste. Com a análise prévia, a nova lei prevê um "Apro às avessas".

Para que a mudança no tempo de análise surta efeito prático, o órgão antitruste conta com a contratação de 200 novos gestores, mais equipamentos e uma sede nova. Com isso e a inclusão de parte da SDE, o orçamento anual do Super Cade mais do que triplicará, passando de R$ 18 milhões para R$ 60 milhões.