Título: De olho na inflação, BCE mantém taxa de juros
Autor: Milanese, Daniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2011, Economia, p. B10

Em sua última reunião no cargo, Trichet opta pelo conservadorismo e deixa taxa em 1,5%

Jean-Claude Trichet despediu-se do Banco Central Europeu (BCE) mantendo seu estilo. Mesmo em meio à maior crise da história do euro, os juros foram mantidos ontem em 1,5% na reunião de política monetária realizada. Mais: com base em seu discurso, analistas já descartam um corte em novembro e adiam a perspectiva de alívio para dezembro.

Este foi o último encontro conduzido por Trichet, que deixará o cargo no final do mês e será substituído pelo italiano Mario Draghi. Embora a maior parte dos analistas esperasse a manutenção dos juros, uma minoria representada por bancos de peso acreditava em redução da taxa - os mercados esperavam alívio de 0,25 ponto porcentual. "Foi uma oportunidade perdida de apresentar uma surpresa positiva", avalia Ken Wattret, analista do BNP Paribas.

Prevaleceu o conservadorismo típico do BCE e a preocupação com a inflação atualmente em 3%, bem acima da meta de 2%, já que a autoridade tem o mandato único de estabilidade dos preços. O BCE optou por usar uma série de medidas não convencionais para aumentar a liquidez do sistema financeiro, grande preocupação do momento. Os bancos europeus encontram-se em situação delicada diante da exposição à dívida de países problemáticos - o franco-belga Dexia precisa de resgate.

Especialistas acreditam que Trichet se mostrou um pouco mais preocupado na tradicional coletiva ontem, mas não a ponto de dar sinais de cortes iminentes dos juros. Essa impressão foi construída pelas afirmações de que a inflação segue elevada e de que os juros de curto prazo permanecem baixos. "O BCE indicou que não está convencido de que a fraqueza é tão severa a ponto de requerer um desaperto convencional", avalia Marco Valli, do UniCredit.

Para Julian Callow, do Barclays Capital, não houve sinais de que uma baixa dos juros virá em novembro e a perspectiva agora se volta para dezembro. "Achamos que a possibilidade de redução em novembro segue limitada", diz o Rabobank.

Tanto o Barclays como o BNP, que esperavam uma redução agora, reforçam que a atividade econômica está piorando, como mostram diversos indicadores, daí a necessidade de alívio. Antes vista como remota, a possibilidade de recessão na zona do euro está cada vez mais presente. "Quanto mais demorar, mais alta é a chance de um corte maior à frente", diz Wattret, do BNP. Ele agora prevê alívio de 0,5 ponto porcentual em dezembro.

Despedida. Alan Greenspan teve a biografia queimada pela crise financeira global vinda com o colapso do Lehman Brothers, em 2008. Muitos culpam a política do ex-presidente do Federal Reserve pela bolha de crédito que arrastou a economia mundial. A pergunta agora é qual será o legado de Trichet, que se despede do BCE em meio à maior crise da história do euro.

Após oito anos no cargo, Trichet conduziu ontem sua última reunião à frente da autoridade monetária . "É o fim de uma era", diz Jim Reid, estrategista-chefe do Deutsche Bank. "A vida não será a mesma sem a nossa sempre interessante coletiva com Trichet."

O cenário não poderia ser pior. A Grécia está à beira de um calote amplo, os bancos europeus vivem na berlinda e as lideranças políticas titubeiam em agir com mais firmeza para resolver os problemas. O próprio BCE tem sido o principal guerreiro nessa frente e até passou por cima do tradicional conservadorismo para comprar títulos da Itália no mercado.

O ambiente significaria um inequívoco corte de juros se não fosse por um detalhe: a inflação na zona do euro bem acima da meta. Tomando o histórico conservador como base, esse ponto foi forte o suficiente para fazer o BCE ignorar todo o resto e adiar uma redução das taxas. Afinal, a autoridade segue seu mandato único de estabilidade dos preços. / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

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