Título: Em nenhum país, montadora começa a produzir com 65% de conteúdo local
Autor: Modé, Leandro
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/09/2011, Economia, p. B6

Projeto de construção de uma fábrica da chinesa JAC Motors só será mantido se o decreto for revisto, diz executivo

Sergio Habib, presidente da JAC Motors

O presidente da JAC Motors no Brasil, Sergio Habib, disse que o projeto de construção de uma fábrica da montadora chinesa no País, anunciado em agosto, depende de mudanças no decreto do governo anunciado quinta-feira, que determina aumento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as montadoras que, entre outros pontos, usam menos de 65% de conteúdo nacional em 80% dos carros produzidos no País.

"Pretendemos continuar com nosso investimento na fábrica desde que haja alguma mudança no decreto na forma em que ele está redigido. Uma fábrica em qualquer País do planeta não pode começar com um índice de nacionalização de 65%. Isso é impossível", afirmou Habib.

No mês passado, a JAC Motors e a SHC, importadora dos carros da montadora chinesa que pertence a Habib, anunciaram planos de investir US$ 600 milhões para construir uma fábrica no Brasil. A unidade, projetada para produzir 100 mil veículos por ano, deve começar a operar em 2014.

Segundo os dados mais recentes divulgados pela Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores (Abeiva), a chinesa JAC Motors, que começou a vender seus carros no Brasil em março, encerrou o mês de agosto com 11,18% do mercado no acumulado do ano entre as empresas importadoras de veículos no Brasil. A JAC Motors vendeu até agora 14.459 veículos no Brasil, e todas as empresas associadas à Abeiva, juntas, venderam este ano 129.281 unidades.

A JAC Motors já é a segunda empresa no ranking da Abeiva, atrás apenas da Kia, que de janeiro a agosto vendeu no Brasil 53.918 unidades. Em terceiro lugar está outra chinesa, a Chery, que há dois anos comercializa seus veículos no País e já está construindo uma fábrica no Brasil. De janeiro a agosto ela vendeu no Brasil 12.770 unidades, o que representa 9,88% do total de carros vendidos pelas associadas da Abeiva.

Apesar do crescimento forte da JAC e da Chery, Habib nega haver uma "invasão" das marcas chinesas no mercado brasileiro. "A soma das marcas chinesas representa 2,5% do mercado, considerando veículos nacionais e importados."

Segundo ele, as concessionárias da JAC Motors têm veículos suficientes em estoque para mais de um mês de vendas sem repassar para o consumidor o aumento do IPI. "Quando for preciso reajustarmos os preços, o aumento será bem menor que 20%", afirma.

De acordo com estimativa do governo, o aumento do imposto, se repassado integralmente ao consumidor, deve girar em torno de 26% a 28%.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual o impacto do aumento do IPI para os veículos da JAC Motors?

Essas medidas afetam a JAC Motors porque concorremos com os carros nacionais. Mas é importante notar que temos 1% do mercado total. Não há uma invasão de carros chineses no Brasil. A soma das marcas chinesas representa apenas 2,5% do mercado, considerando veículos nacionais e importados.

Mas o aumento no preço dos carros da marca deve ser de quanto?

Por enquanto, não vamos aumentar os preços. Temos um bom estoque na rede de concessionárias, suficiente para bem mais que quatro semanas de vendas. Como percebi que a Anfavea estava se mexendo, importei mais carros e já faturamos pra rede. Então os carros nas lojas estão livres do aumento do IPI. Também sou importador da Jaguar e da Aston Martin. Nessas duas marcas o decreto do governo gera um aumento em torno de 25%, mas devemos repassar para o consumidor cerca de 20%. Nos carros da JAC Motors, porém, será bem menos. Ainda não sei dizer quanto, mas será bem menos que 20%.

Muda algo nos planos de implantação de uma fábrica da JAC Motors no Brasil?

Vamos continuar crescendo no Brasil e pretendemos continuar com nosso investimento de fábrica desde que haja alguma mudança no decreto na forma em que ele está redigido. Uma fábrica em qualquer País do planeta não pode começar com um índice de nacionalização de 65%. Isso é impossível. No primeiro ano pode começar com 25%, no segundo pode pular para 40% e no terceiro é que vai chegar em torno de 60%. Esse é um processo paulatino. As únicas empresas que têm condição de já começar com uma integração nacional forte são as empresas já implantadas no País. O decreto, na forma em que está redigido, transforma o Brasil no Clube do Bolinha. Quem está dentro, fica. Quem não está, não vem. Porque não dá para começar uma fábrica e já no primeiro ano preencher os requisitos do decreto.

Então, se o governo não alterar o decreto. o projeto da fábrica da JAC Motors fica inviável?

Sim, se não alterar fica inviável. Mas eu confio que vai ser alterado. Não há nenhuma razão para dar um tratamento fiscal diferenciado para uma empresa que está no Brasil e vai fazer uma fábrica e para outra que está de fora e quer fazer essa mesma fábrica para vender o mesmo produto e eventualmente com preço menor.

Quando a JAC Motors pretende entrar em contato com o governo para discutir isso?

Até o fim do ano, devemos definir o Estado onde vamos implantar nossa fábrica. Aí será uma ação conjunta com o Estado escolhido para ter condições econômicas que permitam implantá-la no Brasil. Estamos negociando com vários Estados.

QUEM É

Sergio Habib é presidente do Grupo SHC, fundado em 1991 e com mais de 50 revendas de marcas como Citroën, Ford, Volkswagen e Jaguar. Habib apostou na chinesa JAC Motors e é responsável pelo marketing, comercialização, assistência técnica, pós-venda e distribuição de peças originais da marca no país.