Título: Super Cade muda concorrência no País
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/10/2011, Economia, p. B10

Obrigação de submeter as fusões antes da realização do negócio leva empresas a terem pressa na decisão da autarquia, o que não ocorre hoje

A aprovação da lei que cria o Super Cade vai mudar a forma de fazer negócios no Brasil, avaliam especialistas. A nova legislação elimina uma anomalia da economia brasileira, que é o fato de as fusões entre empresas serem submetidas ao governo depois de realizadas, e não antes, como é na maioria dos países.

"As empresas, os advogados e os bancos de investimento terão de se acostumar com a nova sistemática", prevê o advogado Lauro Celestino, do escritório Mattos Filho. "Eles terão de se antecipar em relação ao que ocorre hoje." O ex-presidente do Cade Rui Coutinho concorda. "Os contratos precisarão ser feitos com muito mais cuidado", comentou.

Hoje, sob a legislação antiga, duas empresas podem se fundir e começar a operar juntas, enquanto esperam o julgamento pelo Cade. Quando o governo conclui que o negócio prejudica a livre concorrência, o fato já está consumado e resta aos técnicos aplicar "remédios" com o objetivo de atenuar o problema ou comprar uma briga homérica para reverter o negócio. "Esse é o principal defeito da lei atual", disse Celso Campilongo, coordenador do grupo de estudos de direito concorrencial da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e ex-conselheiro do Cade.

Brasil Foods. É o caso, por exemplo, da Brasil Foods, resultado da fusão entre Sadia e Perdigão. O relator do processo, Carlos Ragazzo, propôs a rejeição da operação, mas um acordo capitaneado pelo conselheiro Ricardo Ruiz com a empresa encontrou uma saída: a venda de ativos da BRF para uma só concorrente que possa ter o mesmo poder de competição, no intuito de manter a rivalidade no setor.

A partir da entrada em funcionamento do Super Cade, 180 dias após sancionada a lei, que ainda está em exame no Planalto, valerá a chamada anuência prévia. Apesar da inversão do processo, as companhias poderão anunciar ao mercado sua intenção de negócio.

Isso deve ocorrer principalmente nas empresas que têm ações negociadas em bolsa de valores. Como a operação pode ser vetada, é um risco que essas empresas correm. Com isso, ganham força os advogados especializados, que serão responsáveis por indicar o passo a passo dos trâmites aos executivos.

Para não travar os negócios, as decisões do Cade precisarão ser rápidas. "Eles não podem impedir a economia de girar", defendeu Celestino.

Por isso, foi introduzida uma segunda novidade: casos de fusão que se enquadrem nos parâmetros da lei para serem submetidas ao governo (faturamento anual de pelo menos R$ 400 milhões da maior sócia e de R$ 30 milhões da menor sócia) poderão ser dispensados de julgamento. A decisão caberá ao superintendente-geral.

Prazo. Também para garantir rapidez, foi firmado um prazo máximo para análise pelo Cade: 240 dias, prorrogáveis por mais 90 apenas nos casos muito complicados. Hoje, o prazo total é de 120 dias, mas a contagem é interrompida a cada vez que novas informações são solicitadas. Com a nova lei, os 330 dias correm sem parar.

Hoje, a fusão é comunicada ao Cade até 15 dias após a assinatura do contrato, muitas vezes com informações precárias. Na maior parte dos casos, é de interesse da empresa que o Cade demore a dar sua decisão, pois essa pode implicar restrições ao funcionamento do negócio.

Na anuência prévia, o jogo se inverte: as empresas passam a ter pressa na decisão. Para isso, terão de apresentar informações mais detalhadas.

Se os dados estiverem incompletos, o superintendente pode solicitar a complementação, mas isso será feito apenas uma vez. Se a empresa voltar a falhar na entrega de informações, ela terá de fazer uma nova notificação ao Cade. Cada notificação custa R$ 45 mil.

A primeira análise do Conselho será verificar o conjunto considerado mínimo de informações, como faturamento, características do mercado relevante e fatia de mercado estão disponíveis. "É como se fosse um check list", explicou o presidente em exercício do Cade, Olavo Chinaglia. "As empresas terão de buscar elementos mais robustos para apresentar."

--------------------------------------------------------------------------------