Título: Nosso PIB e o mundo
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/09/2011, Economia, p. B1/10

Indústria se enfraqueceu muito, o que levou à desaceleração do PIB no segundo trimestre, mas a atividade global também está em ritmo mais lento

O PIB do 2. º trimestre não surpreendeu, confirmando a desaceleração da economia brasileira, em linha com o comportamento mais fraco da atividade global. O crescimento trimestral dessazonalizado em termos anualizados (3,2%) foi significativamente mais fraco que o mesmo número para o primeiro trimestre (5,0%), mas deverá ser melhor do que esperamos para os dois trimestres finais do ano (2%), levando o PIB a fechar em 3,3%.

A diferença de crescimento frente ao 1.º trimestre está no comportamento da indústria, que havia se expandido a um ritmo elevado (9,1% na mesma base de comparação) e que mostrou alta de apenas 0,9% no trimestre passado, dada a estagnação da indústria de transformação e crescimento tímido do setor de construção civil. Este comportamento medíocre da indústria de transformação é, em boa parte, explicado por aquilo que o cidadão médio nota no dia a dia: o forte crescimento das importações (26,6%, mesma base).

De boa notícia, o ritmo ainda forte do investimento (7,1%, mesma base), superando a expansão do consumo das famílias (3,9%), embora este último continue como o carro-chefe da economia pelo seu maior peso relativo.

Quais as implicações à frente? A nosso ver, os riscos para o crescimento continuarão elevados pela fraqueza crescente da economia mundial, onde viraram rotina revisões para baixo do crescimento de países desenvolvidos (já mais próximos de zero) e emergentes (ainda com crescimento relevante). Não seremos imunes a essa desaceleração pela combinação "emprego-renda-setor serviços", embora ela não permita também apostar em números excessivamente pessimistas.

Entendemos que foi este cenário que levou o Copom a cortar os juros de forma preventiva, mais cedo do que imaginávamos. Um ciclo de corte de 200 pontos-base da taxa Selic parece possível neste contexto de desaceleração moderada (para repetir o adjetivo usado pelo Copom em seu comunicado). Mas setembro promete ser um longo mês, com muitos riscos, especialmente vindos da Europa, e qualquer previsão hoje é sujeita a um grau de incerteza acima do normal.

O mundo, com muitos problemas, enfrentará nos próximos 5 a 10 anos um contexto de "dominância fiscal", quer pelo endividamento soberano excessivo, quer pelas fragilidades ainda vividas por alguns sistemas bancários (felizmente não o nosso). O trinômio "ajuste fiscal, crescimento baixo, juro baixo" deverá prevalecer. Tomara que também aqui, no sentido de termos uma política fiscal em linha com a sinalização recente dada pelo governo, de modo a dar consistência ao movimento recente do nosso BC e minimizar os impactos sobre nossa trajetória de crescimento, a partir de um "mix" mais adequado de política econômica.

ECONOMISTA-CHEFE DO BANCO J SAFRA