Título: Pelo menos este ano, o pior já passou. Mas não dá para relaxar
Autor: Amorim, Saniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/10/2011, Economia, p. B1

Até dezembro teremos uma desaceleração do IPCA, pois no último trimestre de 2010, puxada pela alimentação, os resultados foram muito elevados. Em 2011, devemos bater na trave e ficar próximos dos 6,5%, como prevê o Banco Central, mas, se o pior já passou, infelizmente, não dá para ficar tranquilo.

As razões para estas preocupações são muitas. Citemos pelo menos duas.

De um lado, os preços agrícolas devem desacelerar com o menor crescimento mundial, mas, dadas às incertezas climáticas, não se podem descartar pressões. Além disso, o câmbio pode (como ocorreu nestas últimas semanas) mais do que compensar os "ganhos" nas quedas das commodities, e também, como aliás já está acontecendo, as economias maduras podem fazer novas rodadas de ações monetárias não convencionais aumentando a liquidez, e voltando a dar gás para operações financeiras que ajudam a alavancar os preços agrícolas.

De outro, o forte aumento da inflação passada pode ser transmitido para inflação futura, dada a estreita margem de ociosidade no mercado de trabalho e de descompasso, embora decrescente, entre as taxas de crescimento da oferta e da demanda.

Os riscos acima mencionados estão muito bem descritos pelo próprio Comitê de Política Monetária (Copom) no recente Relatório de Inflação, ou seja, o próprio Banco Central sabe que sua aposta numa redução, mesmo moderada, na taxa básica de juros, apresenta riscos.

Mas o Copom também se preocupava com a possibilidade de ganhos reais nos dissídios e com a existência de mecanismos regulares e quase automáticos de reajustes - nossa velha indexação. O salário mínimo vai ser reajustado em 14% a partir de janeiro, os serviços continuam variando próximos de 9,0%.

Estas são as razões para não ficarmos tranquilos, apesar da desaceleração da inflação neste último trimestre. Mas, se de fato a crise mundial se agravar e se a confiança na economia brasileira for mantida, evitando novas pressões no câmbio - e, para isso, seria importante que medidas recentes que desorganizaram o mercado futuro de câmbio fossem revertidas -, poderemos ter uma inflação mais para 5,0% em 2012.

Mas será que temos de torcer para um fracasso das tentativas de segurar a crise do euro e um agravamento da situação política nos Estados Unidos, para que a nossa inflação convirja para a meta? Não seria melhor que retomássemos a agenda de medidas estruturais de longo prazo, que permitiriam uma queda sustentada do juros real, e não uma queda que no fundo depende de uma inflação mais alta para que o crescimento se sustente?