Título: Petrobrás descarta perda de interesse de petroleiras estrangeiras pelo Brasil
Autor: Milanese, Daniela
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/10/2011, Economia, p. B12

Para Gabrielli, empresas como Repsol e BG vendem fatias em blocos para se capitalizar e investir mais no País

Nos últimos meses, surgiram várias notícias de petroleiras estrangeiras vendendo participações no Brasil, especialmente no pré-sal - a Repsol vendeu 40% de seus negócios no País para a chinesa Sinopec e há informações de que a britânica BG também estaria em busca de um sócio, por exemplo. Para o presidente da Petrobrás, José Sergio Gabrielli, porém, isso não significa que essas empresas queiram deixar o País. "É uma estratégia de reforço no Brasil, muito mais do que de fuga", afirmou em entrevista à Agência Estado, em Paris, onde participa hoje de reunião da Agência Internacional de Energia (AIE). Gabrielli também disse que não analisa a possibilidade de participar da privatização da portuguesa Galp, com a justificativa de que tem muito a fazer no Brasil. Aliás, a Petrobrás colocou em curso uma estratégia de desinvestimento de US$ 13,6 bilhões, que pode incluir ativos estrangeiros, como a refinaria japonesa Nansei Sekiyu. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Há petroleiras estrangeiras querendo vender ativos no Brasil. Qual o interesse da Petrobrás?

Não é verdade. Se você pegar o que está acontecendo com a BG, o que aconteceu com a Repsol e o que está acontecendo com a Galp, aparentemente elas não estão saindo do Brasil, nem estão vendendo participação que têm nos nossos blocos (as três empresas são parceiras da Petrobrás).

A BG não quer vender participação no pré-sal?

Não, eles estão vendendo participação nas ações deles, o que é diferente. Não estão fazendo venda de ativos no Brasil. Ao contrário, estão levantando recursos para ficar no Brasil.

O que se fala é que a BG quer vender especificamente uma fatia da participação no pré-sal.

Se eles venderem, nós temos direito de preferência, mas eles não vão vender. Eles vão ter sócio. É uma estratégia de reforço no Brasil, muito mais do que de fuga. Estão levantando recursos para financiar os investimentos. Foi exatamente o que aconteceu com a Repsol.

Como o sr. vê o interesse de empresas chinesas, e até russas, no Brasil?

A Sinopec comprou a Repsol porque quer estar próxima da produção de petróleo. Isso é muito bom para o Brasil.

Não incomoda a Petrobrás?

Nosso sócio não é a empresa chinesa, é a Repsol, que é a controladora. Por que incomodaria? Eles não estão comprando diretamente os ativos, estão participando e sendo sócios das empresas, estão bancando mais recursos para investir.

Está descartada a possibilidade de a Petrobrás entrar no processo de privatização da Galp?

Não estamos fazendo nenhuma discussão sobre Galp neste momento. Não fizemos nenhum movimento em direção à Galp, a imprensa publicou várias vezes que fizemos movimento e nós dissemos que estávamos analisando as possibilidades, como sempre analisamos. Mais do que isso, não fizemos.

O sr. afirmou recentemente que, dentro da estratégia de desinvestimentos da empresa, uma possibilidade é a venda da refinaria Nansei Sekiyu, no Japão. Alguma novidade sobre isso?

Não.

A refinaria nos Estados Unidos poderá ser vendida?

Não vamos comentar ativo por ativo até decidirmos o que fazer. Neste momento, estamos discutindo se vamos apresentar um pacote com todos os ativos conjuntamente ou se vamos fazer uma oferta peça por peça. Essa é a decisão que precisamos tomar.

Em que ponto está o processo?

Não posso comentar. O projeto todo é de US$ 13,6 bilhões. Nada mais do que isso posso dizer neste momento. Temos dois anos e meio para fazer isso e não temos pressa. Temos US$ 26 bilhões em caixa.

Qual é o efeito das importações de gasolina na balança comercial da empresa?

Vamos importar provavelmente três vezes mais do que importamos no ano passado. Isso significa que, no ano passado, importamos três dias de consumo e neste ano vamos importar nove dias de consumo.

Não é uma grande diferença?

De três para nove dias em 365?

Mas a Petrobrás está tendo prejuízo com essas importações.

Sim, estamos tendo prejuízo, mas tivemos lucro quando mantivemos o preço acima do internacional em 2009 e 2010. Manter o preço estável traz um ponto positivo, que é a estabilidade do fluxo de caixa em momento de alta volatilidade de preço. Desde 2008, o Ebitda da Petrobrás variou entre US$ 29 bilhões e US$ 35 bilhões em 12 meses. O preço variou de US$ 147 em julho de 2008, US$ 33 em dezembro de 2008, US$ 75 em 2009, US$ 85 em 2010 e em 2011 o preço ficou entre US$ 85 e US$ 125. Tem uma enorme flutuação de preços e a nossa receita ficou praticamente estável. Porque reduzimos o preço em maio de 2009 e o valor ficou estável nesse período todo. Seguimos o preço internacional no longo prazo. A análise (de que a Petrobrás tem perdas com as vendas no mercado interno) está errada. Provavelmente, devemos ter hoje um prêmio.

De quanto?

Não sei, não faço essa conta. Desde 2002, não de 2009. Desde que adotamos a política de acompanhar o preço internacional no longo prazo. Se comparar com o preço no Golfo do México, não com o preço nos Estados Unidos, provavelmente acumulamos prêmio. Hoje, todo o mercado está dizendo que o preço futuro da gasolina (no mercado internacional) vai cair, porque depende da sazonalidade do mercado americano no curto prazo.

E o preço internacional do petróleo, vai cair?

Não. Nos últimos cinco anos, a demanda mundial por petróleo subiu de 83 milhões de barris por dia para 87 milhões de barris por dia. Tivemos crise nos EUA, crise na Europa, terremoto no Japão e o mercado cresceu, porque os emergentes compraram mais e continuam crescendo. Não vejo razão para isso se modificar no curto prazo.

Mas a China começou a desacelerar.

Sim, vai cair de 9,5% para 7%. É um bocado de demanda. O crescimento desses países depende muito mais dos seus mercados internos, que passam por processo de redistribuição de renda, que é intensiva em energia. Os pobres consomem mais energia. Não estamos esperando nenhuma grande mudança na demanda no médio prazo. Pode ser que tenha um cataclismo no mundo, as pessoas deixem de usar ar-condicionado, aquecimento, passem a andar de cavalo, a morar na roça. É uma mudança de civilização. O segundo ponto é o da oferta, porque o barril de petróleo novo vai custar mais que o antigo. Não tem porquê o preço cair. Agora, como as taxas de juros estão muito baixas e existe hoje muita demanda por aplicações, o volume de transações financeiras com o petróleo aumenta muito e dá volatilidade ao preço.

Há algo que possa ser feito sobre a especulação no mercado de petróleo? O G-20 vem analisando essa questão.

A regulação internacional vai crescer. Minha expectativa é a de que a regulação dos fluxos financeiros, particularmente dos OTCs (derivativos de balcão), vai aumentar, e tem de aumentar. Cada vez mais fica claro que a solução da crise é global, e não de cada país. A Europa mostra isso claramente.

Qual será o efeito da desvalorização do real sobre o balanço da Petrobrás?

Qual foi a desvalorização? Saímos de R$ 1,58 para R$ 1,95 e estamos a R$ 1,70. Trabalhamos com R$ 1,73 no longo prazo. É óbvio que tem impacto, mas é de curto prazo, dentro do trimestre.

Mas o governo trabalha para ter uma moeda menos valorizada. No final das contas, o dólar mais forte tem impacto positivo ou negativo sobre o balanço da Petrobrás?

Ninguém sabe. O câmbio tem efeito sobre as variáveis de estoque (valor do ativo, dívida, equivalência patrimonial) medida pela taxa do último dia do período. Mas, o efeito sobre as variáveis de fluxo (importações, exportações e pagamento de dívida, juros e dividendos) depende da velocidade de ajuste do câmbio dentro do período. No caso da Petrobrás, que é grande investidora internacional, tem grande dívida em dólar, é grande importadora e exportadora, não é possível prever os efeitos. É por isso que não temos hedge - nosso hedge é natural.