Título: Balanço final da reunião do G-20
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/11/2011, Notas e informações, p. A3

A reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20), em Cannes, foi um cenário solene para uns poucos fatos importantes, como o ultimato ao primeiro-ministro grego, George Papandreou, para desistir de um referendo sobre a ajuda financeira negociada na semana anterior. De positivo, produziu pouco. Tão relevante quanto surpreendente foi o apelo do primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para acompanhar as contas de seu governo e servir como avalista moral perante o mercado financeiro. Terceira maior economia da zona do euro, a Itália, com uma dívida pública próxima de 120% de seu Produto Interno Bruto (PIB), tem sofrido os efeitos da grande tensão gerada pela crise da Grécia e de outros pequenos países da chamada periferia europeia. O encontro foi também um bom cenário para o último ato público do economista Mario Draghi na presidência do Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board).

Ele entregou ao G-20 as últimas informações sobre o programa de reforma do sistema financeiro e uma lista de 29 instituições "sistemicamente importantes", tradicionalmente consideradas "grandes demais para quebrar". Os estudos incluem normas de regulação bancária e políticas para facilitar, em caso de necessidade, a implosão dos maiores bancos do mundo. No dia anterior, em sua primeira entrevista coletiva como novo presidente do Banco Central Europeu (BCE), ele havia anunciado sobre o surpreendente corte de juros decidido pouco antes e já era saudado nos meios financeiros como Super-Mario. Como figura pública, foi ele, com certeza, quem mais lucrou na semana.

Nenhum acordo justificou a presença de governantes das 20 maiores economias. Nenhum líder de fora da Europa assumiu o compromisso de reforçar a Linha Europeia de Estabilização Financeira (EFSF). Também não houve acordo sobre como canalizar a ajuda por intermédio do FMI, solução preferida pela presidente Dilma Rousseff e por seus colegas das grandes economias emergentes.

Também não houve progresso no debate sobre a instituição de um imposto global sobre operações financeiras. O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, propôs em setembro a adoção de um imposto desse tipo no bloco europeu, com apoio dos governos da França e da Alemanha. Mas a criação do tributo depende da aprovação dos 27 países-membros e a ideia é rejeitada na Inglaterra.

No G-20, a oposição a uma taxa sobre operações financeiras é liderada pelo governo americano. O governo brasileiro foi contrário à proposta até há pouco tempo. Em Cannes, no entanto, a presidente Dilma Rousseff declarou-se disposta a apoiar a criação do tributo em troca da adoção, por todos os países, de um "piso de proteção social" definido pela Organização Internacional do Trabalho. Uma referência a esse piso foi incluída na declaração final do encontro, mas a menção a esse ponto, no documento, não passou de retórica.

Aquele mínimo de proteção social já existe na maior parte das economias capitalistas, há muito tempo. A única novidade importante seria a sua adoção por algumas potências comerciais da Ásia, incluída a China, mas o governo chinês, como tem feito até agora, adotará reformas de acordo com seu critério e segundo suas conveniências. Por isso, seus líderes não se opõem a subscrever qualquer compromisso simpático e mais ou menos vago nas declarações oficiais do G-20. Esse mesmo documento, divulgado ontem, inclui também um compromisso geral de adoção o mais rapidamente possível de regimes cambiais mais flexíveis e mais dependentes do mercado. Representantes da China já prometeram isso em outras ocasiões, mas o yuan permanece depreciado e continua barateando as exportações chinesas.

Se o governo grego de fato cumprir os compromissos assumidos em troca da ajuda e do perdão de 50% de sua dívida, as conversas em Cannes terão servido para alguma coisa. A semana terá sido positiva, também, se as pressões do mercado sobre o Tesouro e os bancos italianos diminuírem. Mas uma reunião de cúpula do G-20 deveria produzir resultados muito mais amplos.