Título: CVM pode incluir novos acusados no caso dos derivativos da Aracruz
Autor: Valle, Sabrina
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/11/2011, Negócios, p. B14

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pode incluir novos acusados no emblemático caso de derivativos cambiais tóxicos da Aracruz, operação que levou a empresa a um rombo de US$ 2,13 bilhões em 2008, colocando sua sobrevivência em risco.

A CVM considerou que a acusação estava incompleta e mandou aprofundar as investigações, após suspender o julgamento de 8 de dezembro de 2010. Segundo fontes, a acusação pode ser refeita e até reformulada, o que seria inédito na autarquia.

Ao justificar a determinação de novas investigações, o diretor relator do caso, Otavio Yazbek, disse que pontos relevantes do dever de administradores e membros de comitê foram desconsiderados inicialmente na acusação. "Naturalmente se refletiu nas diligências adotadas", escreveu em despacho. As áreas de acusação (técnica) e de julgamento (diretoria) atuam separadamente dentro da CVM.

O que está em questão, segundo Yazbek, é a estrutura de governança da companhia e, especialmente, os mecanismos utilizados para o monitoramento do risco financeiro - numa discussão que serve de exemplo para o resto do mercado brasileiro.

Desde o julgamento da Sadia, caso gêmeo realizado uma semana depois do julgamento desmarcado da Aracruz, a CVM inaugurou novo entendimento sobre os deveres de administradores e membros de comitês de auditoria e finanças. Hoje, também é dever deles criar mecanismos de controle para evitar operações como as dos derivativos tóxicos, e não agir apenas quando alertados dos riscos. A posição, que vem sendo repetida publicamente pela autarquia desde então, também foi reforçada no documento sobre o caso Aracruz.

"Naturalmente, não se pode presumir que o dever de diligência dos administradores seja exercido nos mesmos termos que acontecia no passado", disse Yazbek. "A estruturação adequada daqueles controles tornou-se parte essencial do dever de diligência dos administradores."

O diretor determinou que o caso voltasse à investigação e que fossem ouvidos todos os executivos que compunham o conselho de administração na época em que eclodiu a crise dos derivativos cambiais no Brasil, durante a crise internacional de 2008. Isso inclui os conselheiros que não foram acusados e que até então só se manifestaram por escrito.

Ao contrário do caso Sadia, em que todos os membros do conselho de administração foram acusados, no da Aracruz apenas dois integram a lista - Luiz Aranha Corrêa do Lago e Raul Calfat. Segundo o despacho, eles teriam tido acesso a determinadas informações que poderiam ser consideradas "sinais de alerta" sobre o risco das operações.

Demais oito membros titulares do conselho à época ficaram de fora: Álvaro Luis Veloso, Carlos Alberto Vieira, Ernane Galvêas, João Carlos Chede, Haakon Lorentzen, Eliezer Batista da Silva, Sergio Duarte Pinheiro, Jorge Eduardo Martins Moraes e Alexandre Silva D"Ambrosio.

Multas. No caso Sadia, foram acusados todos os membros do conselho de administração, do comitê de auditoria e do comitê de finanças, além do diretor financeiro. Entendeu-se que todos acompanhavam a execução da política financeira do grupo. Dez dos 14 acusados foram condenados em dezembro a multas de R$ 200 mil a R$ 400 mil, com pena maior para os conselheiros que também eram membros de comitês. O diretor financeiro foi inabilitado por três anos.

Na Aracruz, a acusação foi similar, com exceção do conselho de administração. Foram acusados o ex-diretor financeiro Isac Zagury; o ex-presidente Carlos Augusto Lira Aguiar; os membros do comitê de Finanças Luciano Soares, João Cesar de Queiroz Tourinho e Valdir Roque; e os membros do comitê de Auditoria Isaac Sutton, Mauro Agonilha e Sérgio Duarte Pinheiro.

Parte dos acusados tenta um acordo com a CVM e tem esperanças de se livrar do caso sem presunção de culpa. O fato de a CVM ter determinado novas diligências não significa necessariamente que serão incluídos novos acusados, apenas que a possibilidade está em estudo.

Depois de revisada a acusação, a CVM abrirá prazo para que os acusados se manifestem. Não há previsão para novo julgamento. A CVM não comenta casos específicos e reitera, em nota, "que as informações que são de conhecimento público estão disponíveis no site da autarquia".