Título: G-20 discute recapitalização do FMI
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2011, Economia, p. B12

Enquanto Europa busca acordo sobre suas medidas, Brics defendem o aumento dos recursos; Brasil está de olho em mais poder no Fundo

Dois anos e meio depois de triplicar os recursos na cúpula do G-20 de Londres, o Fundo Monetário Internacional (FMI) está de volta ao centro das discussões das maiores economias do mundo. Reunidos em Paris, ministros de Finanças discutem a recapitalização do Fundo, que pode receber mais € 350 bilhões para enfrentar a crise das dívidas soberanas e, se necessário, participar do salvamento do sistema financeiro da Europa. De olho em mais poder na instituição, Brasil e China defendem o projeto, e teriam o apoio da França.

O debate sobre os recursos do FMI é um dos dois grandes polos de negociações na reunião ministerial do G-20, aberta ontem, em Paris. O outro é, claro, a "estratégia global" que a Europa, liderada por Alemanha e França, prepara para enfrentar a turbulência na Grécia e o risco de contágio de grandes países e, por consequência, do sistema financeiro. O risco de que os € 440 bilhões do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef) não sejam suficientes para socorrer países como Itália ou Espanha move as preocupações. Nesse caso, seria necessária a participação conjunta do FMI.

Desde o início da crise das dívidas soberanas, o FMI já fez parte dos programas de socorro à Grécia, à Irlanda e a Portugal, injetando um terço dos recursos. Até julho, o Fundo já havia se comprometido com US$ 391 bilhões em ajudas aos três países. Estudos internos da instituição indicam que o Fundo ainda teria à disposição US$ 390 bilhões para empréstimos - do US$ 1 trilhão que dispunha em maio de 2009. O mesmo estudo indica que esse valor pode ser insuficiente em caso de contaminação da crise pela Itália e Espanha. No pior dos casos, diz o estudo, o Fundo poderia precisar de US$ 840 bilhões para intervir e evitar o aprofundamento da crise.

Reforço no Fundo. Baseado nessas informações, o Brasil defende em Paris - com apoio da China e da Índia - a recapitalização do FMI. Depois de propor ajuda direta do Brics à Europa, em setembro, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, faz campanha pelo aumento dos recursos do Fundo. "Há um certo consenso de que devemos reforçar o Fundo, pelo menos da parte da França e do Brasil", disse o ministro ontem, logo após seu encontro com François Baroin, ministro da Finanças francês. "É importante que diante de uma nova crise mundial, o Fundo tenha mais recursos disponíveis, que poderá utilizar não só para os países europeus, mas também para os emergentes, que poderão ser afetados caso a crise se agrave."

De acordo com Mantega, a discussão não vai se encerrar hoje, no G-20 ministerial, mas será resolvida até a cúpula do G-20, em Cannes, em 3 e 4 de novembro. O impasse gira em torno do modelo de recapitalização. No cenário ideal, o Brasil defenderia a redistribuição de cotas, o que aumentaria o poder dos países que injetarem recursos do Fundo, mas essa proposta enfrenta resistências dos EUA, do Japão e de alguns países europeus - os maiores mandatários do FMI atual.

Entre as outras hipóteses estão empréstimos bilaterais e uma sociedade de propósito específico - special purpose vehicle, quando são emitidos bônus para uma operação específica.

Para avançar em suas intenções, entretanto, os países emergentes precisam superar as reticências de quem se opõe ao aumento dos recursos. É o caso dos EUA e da Alemanha. Ontem, Wolfgang Schäuble, ministro de Finanças alemão, disse acreditar que o FMI "tem meios suficientes para cumprir sua missão". "Os europeus devem assumir eles mesmos a maior parte da tarefa", reiterou.

Estratégia global. Os detalhes ainda não foram oficialmente revelados, mas cinco dias após o acordo de princípios entre Nicolas Sarkozy e Angela Merkel, os governos da França e da Alemanha teriam selado os detalhes da "estratégia global" para enfrentar a crise na Europa. A afirmação foi feita ontem, em Paris, pelos ministros de Finanças dos dois países, François Baroin e Wolfgang Schäuble. Entre as medidas, estaria o corte de 50% dos títulos da dívida da Grécia.

O plano não foi revelado, mas o acordo foi anunciado na tarde de ontem. "Nós avançamos muito para encontrar as modalidades de um acordo para um pacote global e sustentável", disse Baroin aos jornalistas, reiterando: "Vamos continuar discutindo nos próximos dias, mas já acertamos acordos muito importantes". Segundo o ministro, o acerto compreende também a recapitalização do sistema financeiro europeu e a reforma da governança da zona do euro.