Título: Os desafios da Ásia para o Brasil
Autor: Barbosa, Rubens
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/11/2011, Espaço aberto, p. A2

Convidado pelo Centro de Pensamento Estratégico da Colômbia importante fórum de debates entre governo, setor privado e universidade criado pelo Ministério das Relaçoes Exteriores daquele país, participei em Bogotá, na semana passada, de encontro promovido pela Cátedra Ásia-Pacifico para discutir as percepções e políticas do Brasil em relação a esse continente. Voltada para o Pacifico, a Colômbia, juntamente com Peru, Chile e México, está buscando ampliar a cooperação com os países asiáticos.

Em minha apresentação, ressaltei a prioridade que o governo brasileiro vem dando à Ásia nos últimos dez anos, no contexto da política Sul-Sul. Chamei também a atenção para as medidas que foram tomadas para ampliar a cooperação com a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean) e para os efeitos da crescente influencia, particularmente da China, sobre a economia e a política externa brasileira.

Em uma década a Ásia se tornou a principal parceira do Brasil, superando a União Européia e a América Latina. A China desde 2009 passou a ser o mercado individual mais importante, ultrapassando os EUA. Em 2011 mais de 28% das exportações e 31% das importações do Brasil estão concentradas na Ásia. A decisão da presidente Dilma Rousseff de visitar a China em sua primeira missão oficial fora da América do Sul demonstra relevância que tem esse país na política externa brasileira.

As transformações que ocorrerão no mundo sinocêntrico, em rápida formação, obrigarão países como o Brasil a tomar, no curto prazo, decisões estratégicas para corrigir distorções na economia e para modificar as ênfases no relacionamento com seu entorno geográfico.

As nossas dinâmicas relações com a China estão trazendo oportunidades e desafios que terão de ser respondidos não com improvisações, mas a partir de uma visão estratégica de médio e de longo prazos. As exportações de produtos agrícolas e de minérios deverão continuar a crescer. E a gradual substituição de produtos industriais brasileiros por produtos importados da China poderá acentuar a queda da participação da indústria no nosso produto interno bruto (PIB). A tendência da concentração das exportações em poucos produtos primários e a desindustrialização – se, no curto prazo, não forem enfrentadas com políticas efetivas – poderão reduzir o Brasil à categoria de simples produtor de commodities e a nossa indústria, ao mercado domestico. É isso que desejamos para o nosso país? Como aumentar a competitividade da economia brasileira para evitar efeitos negativos sobre a indústria? Como executar uma política de atração de investimentos nas áreas de alta tecnologia? Qual o papel do Estado na busca da inovação para modernizar o parque industrial e diversificar as nossas exportações?

Os efeitos negativos da reprimarização e o desaparecimento de setores industriais pela competição com produtos chineses começam a ser sentidos também nsod emais países da região. Qual o efeito disso sobre nosso relacionamento com os vizinhos e sobre o processo de integração regional? À luz dessas realidades, o Brasil precisa repensar a visão que temos da parceria com nossos entorno geográfico. A América do Sul está dividida, dificultando a busca de convergências políticas e comerciais. O crescimento do intercambio comercial, apesar da paralisia das negociações para aumentar as trocas entre os países sul-americanos, faz com que acentue a percepção de que a integração regional não é mais necessária. Uma maior projeção brasileira no mundo tenderá a reduzir gradualmente o peso da América da América do Sul na nossa política externa.

O crescimento da nossa economia e a presença cada vez mais visível de empresas brasileiras nos países vizinhos despertam sentimentos contraditórios. Alguns deles vêem o Brasil como uma ameaça à sua soberania e sua economia. Essa percepção vem propiciando movimentos centrípetos e a formação de coalizões, como a assinatura de acordos de livre-comércio com os EUA e a China, a associação de bolsas de valores da Colômbia, do Peru e do Chile e o Acordo do Pacifico, entre a Colômbia, Chile, Peru e México. Essas iniciativas, como também as adotadas pela Argentina que visam a substituir, via medidas protecionistas ilegais, produtos brasileiros por chineses e de outros países, são claros contrapesos à crescente importância regional do Brasil.

Como o Brasil reagirá a essa visão desconfiada de nossos vizinhos? Em termo da integração econômica-comercial, a meu ver, o País deveria aprofundar os acordos comerciais com todos os países da região, oferecendo a abertura completa de nosso mercado, com regras de origem claras e rígidas, e acelerar a execução de projetos de infraestrutura – rodovias, ferrovias e melhoria das facilidades portuárias – que facilitem o acesso de produtos brasileiros ao mercado asiático pelos portos do Pacifico.

As dificuldades que os países sul-americanos enfrentarão para exportar produtos não agrícolas ou minerais para os mercados europeu e americano, em razão da presença da China como, produtora industrial global, tenderá a criar nos próximos 15 a 20 anos uma dependência crescente das economias da região em relação ao mercado brasileiro.

Por tudo isso, o mundo sinocêntrico deverá obrigar o Brasil a redefinir sua política na região, em especial no tocante ao processo de integração regional com ênfase na integração física, e a reduzir os custos internos (taxa de juros, energia, impostos, infraestrutura) para aumentar a competitividade da economia com vista a recuperar o dinamismo, o crescimento e a modernização da indústria nacional.

O pensamento estratégico deve antecipar os acontecimentos e acelerar sua ocorrência Chegou a hora de pensar mais no interesse nacional do que em parcerias estratégicas e políticas de generosidade.

* Presidente do Conselho de Comércio Exterior da FIESP