Título: Argentinos e uruguaios reveem repressão por caminhos diferentes
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/10/2011, Internacional, p. A14

A Argentina e o Uruguai tiveram ditaduras praticamente simultâneas, que foram encerradas com pouco tempo de diferença (o primeiro país em 1983 e o segundo em 1985). Mas, enquanto que o regime militar argentino estava desprestigiado após a derrota na Guerra das Malvinas (1982), a ditadura uruguaia conseguiu condicionar parte do processo de redemocratização.

Na Argentina, os militares concederam a si mesmos uma autoanistia meses antes de entregar o poder. Mas, como primeira medida, o presidente Raúl Alfonsín decretou a anulação do perdão. Em 1985 levou os militares envolvidos nos crimes da ditadura ao banco dos réus. No entanto, várias revoltas nos quartéis forçaram Alfonsín a declarar a Lei de Ponto Final (que encerrava a abertura de novos processos) em 1986 e a de Obediência Devida (que determinava que os oficiais subalternos haviam cometido os crimes por ordens superiores, eximindo-os de culpa) em 1987.

Em 1990, o presidente Carlos Menem decretou uma anistia para os chefes militares que ainda estavam presos. Os ex-integrantes da ditadura desfrutaram de liberdade até que, em 1998, os organismos de defesa dos direitos humanos encontraram brechas na lei e iniciaram processos contra os militares que haviam sequestrados bebês (crime que não estava contemplado nos perdões).

A partir de 1999 surgiram diversas tentativas de anular as leis do perdão no Parlamento. Em 2003 a Corte Suprema determinou a revogação, que foi confirmada pelo Parlamento em 2005. De lá para cá centenas de casos foram abertos contra os ex-torturadores, a maior parte dos quais foram condenados a penas em prisões comuns.

Em 1986, a pressão nos quartéis uruguaios durante a presidência de Julio Maria Sanguinetti levou à aprovação da Lei de Caducidade Punitiva do Estado, que determinava a anistia aos militares por crimes cometidos dentro do Uruguai. Mas, em 2006, por meio de brechas na lei de anistia, os uruguaios conseguiram julgar os ex-presidentes Juan Maria Bordaberry e Gregório Alvarez por participação no sequestro, tortura e assassinatos de uruguaios fora do país.

Em 2010, os uruguaios participaram de um plebiscito que confirmou a decisão de manter a Lei de Caducidade. Mas a coalizão de centro-esquerda Frente Ampla insistiu no Parlamento com a revogação. Há poucos meses, a iniciativa foi novamente derrubada. Mas, nesta semana, o Congresso uruguaio finalmente anulou a anistia.